Troféus e conquistas: benção ou castigo?

Troféus e conquistas fazem parte de nossas jogatinas, e a existência de lados positivos e negativos é inegável.

em 24/05/2017
Três décadas atrás, uma conquista não era algo muito relacionado exatamente a jogos eletrônicos. Bem, talvez fora do meio gamer ainda não seja, mas uma conquista (ou troféu), para nós, tem um significado muito maior. É, em uma de suas melhores definições do inglês “achievement”, um feito heróico. Para o bem ou para o mal, é inegável que as conquistas e troféus vieram para ficar, já perdurando por duas gerações de consoles desde sua popularização. Mas isso é bom ou ruim para os jogadores? A resposta depende da perspectiva de quem joga.

Dos scoreboards à atualização e popularização com o Gamerscore

De acordo com a Wikipedia, no início da década de 80, a Activision enviava nos manuais de seus jogos instruções que indicavam aos jogadores que atingissem uma alta pontuação, e que enviassem imagens desses feitos para que recebessem uma espécie de distintivo em metal, quase como uma condecoração por suas façanhas nos jogos. Esse sistema durou um ano apenas. Em 1990, o jogo E-Motion, do Amiga, trouxe um sistema de conquistas chamado de “secret bonuses”, que instigava o jogador a completar certos requisitos dentro do jogo — possivelmente um dos primeiros sistemas de conquistas programado dentro de um jogo. Muito antes da popularização dos sistemas de conquistas por plataformas, alguns jogos disponibilizavam listagem de feitos por conta própria e em seus sites oficiais, como World of Warcraft e Final Fantasy XIV.

Apesar de sua introdução não ter sido exatamente com o lançamento do Xbox 360 em 2005, foi nesse momento que o sistema de conquistas se encorpou e ganhou uma forma mais bem definida com o Gamerscore, que dava aos jogadores a chance de acumular pontos, seja para realização pessoal ou para mostrar aos amigos o que haviam alcançado em seus jogos. O sistema se expandiu para o Games for Windows Live em 2007, e em 2008 foi adaptado para o PlayStation 3 pela Sony, que colocou troféus de ouro, prata, bronze e platina no lugar da pontuação das conquistas. Atualmente, diversas plataformas possuem sistemas de conquista, desde os consoles atuais, como Xbox One e PlayStation 4, passando pelo PC com o Steam e Origin, e até mesmo dispositivos móveis Android e iOS.

Uma existência de múltiplas razões

Por muitos anos, o objetivo de um jogo fora mudando, mas sempre culminava em um propósito maior, que era o jogador finalizá-lo. Conforme novas ideias surgiam, novos desafios eram implementados. Se antes zerar um game significava que sua vida útil havia acabado, a implementação da escolha de dificuldades possibilitou encarar os games tanto de forma mais fácil quanto de forma mais desafiadora. Quem nunca se gabou por ter finalizado Donkey Kong Country sem perder nenhuma vida? Ou por zerar Metal Gear Solid 3 sem matar nenhum inimigo? Com o sistema de conquistas, tais feitos podem ser mostrados, como uma prova legítima de nossas maiores façanhas virtuais. Além disso, temos mais motivos para encarar novamente algo que já terminamos. Tal sistema dá uma longevidade maior aos títulos que jogamos atualmente, desde que o jogador encare-o como um desafio, e não como um fardo.



Ao buscar alcançar todas as conquistas oferecidas por um game, o jogador tem a oportunidade de experimentar seu entretenimento virtual de maneiras que não seriam sua primeira escolha. As conquistas não oferecem apenas pontos ou classificação, mas também a chance de conhecer os jogos através de escopos e formas diferentes, sendo alguns mais complexos do que outros. Oferecem, também, uma competição sadia entre os jogadores, criando um ambiente de disputa, na maioria das vezes, amigável e gostoso de se participar.

É possível afirmar que nem somente coisas boas o sistema de conquista trouxe até os jogadores. Disputas saudáveis podem se tornar competições agressivas. Por experiência própria, é possível presenciar e fazer parte de desavenças, tudo por conta de uma conquista ou troféu. Convenhamos, nada disso vale uma amizade perdida.

Faca de dois gumes

A maneira como conquistas e troféus são criados depende dos desenvolvedores de jogos. Os feitos a serem alcançados são decididos por eles, e podem surgir tanto desafios prazerosos de se encarar quanto desafios penosos de serem vencidos. Existem games em que as tarefas são simples e diretas, como The Walking Dead (Multi), da Telltale, em que se atingir 100% de suas conquistas exige apenas que o jogador finalize o jogo. Há também jogos que possuem uma gama de detalhes a mais em sua lista de conquistas. É comum ver tarefas como “Derrote X inimigos de Y maneira”, ou “Passe por X nível sem ser visto”.



Pensando em jogos mais difíceis de se obter 100% de sucesso em suas conquistas, podemos dizer que existem aqueles que simplesmente brincam com a sanidade do jogador, transformando a longevidade criada por suas conquistas e troféus em uma tentativa desvairada e sem diversão para quem está com o controle nas mãos. Citarei aqui a conquista “The Shadows Rushed Me”, de Max Payne 3 (Multi). A tarefa para se obter tal conquista consiste em finalizar todo o modo campanha na dificuldade New York Minute Hardcore. O jogador tem um minuto para passar cada capítulo, e para cada inimigo morto, ganha-se um tempo bônus. Morreu? Volte para o começo do jogo. Hardcore não apenas no nome, não é mesmo? Eu respeito muito quem tem essa conquista, e torço para que não tenham quebrado nada, principalmente sua saúde mental, durante o processo de obtenção de tal façanha.


Se por um lado as conquistas e troféus trazem desafios e longevidade aos jogos, também pode-se dizer que alguns deles levam à quebra de diversão e se tornam nada mais do que um vício em uma ganância por se obter algo “especial”. E quando a diversão em jogar é algo que se é colocado em cheque, o sentido de jogar videogame acaba se perdendo.

Revisão: Ana Krishna Peixoto


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