Dead Cells (PC) se autodenomina um "roguevania", ou seja, uma mistura de roguelike com metroidvania. Depois de jogar um pouco, é fácil perceber que ele não é exatamente o que promete, porém tem seus méritos, o que o faz uma experiência divertida e viciante. O título acabou de ser disponibilizado no programa Early Access e apresenta um nível de polimento bem alto, por mais que há o que melhorar.
Um ser imortal em uma ilha misteriosa
A essência de Dead Cells é bem simples: controlamos uma espécie de espírito imortal que precisa explorar uma ilha que muda toda vez que é visitada, em uma aventura 2D com gráficos em pixel art. Pelo caminho, é necessário derrotar inúmeros inimigos e superar alguns desafios de plataforma, sendo que há vários poderes e armas a serem encontrados nos cenários.O jogo utiliza conceitos de roguelike, sendo que nesse caso está mais para a variação “lite” do gênero. Ao morrer, voltamos para o início da aventura e perdemos todos os itens e melhorias conquistados, como é de praxe desse estilo de jogo. Além disso, o desenho dos mapas é gerado proceduralmente, o que oferece uma aventura diferente a cada partida. O “lite” vem do fato de que o jogo é bem menos punitivo o que parece: há habilidades e itens que são desbloqueados permanentemente, o que faz com que a jornada fique mais acessível com o passar do tempo.
Visualmente, o título utiliza o estilo pixel art, que está muito em alta no cenário indie. É tudo muito bonito e elaborado, remetendo bem aos metroidvanias mais clássicos. Gosto, especialmente, da movimentação estilosa dos personagens do jogo. Há alguns problemas técnicos, como eventuais engasgos e travamentos, o que pode ser relevado pelo fato de ainda estar no programa Early Access.
Explorando e morrendo
Jogar Dead Cells é uma experiência interessante e divertida por conta da combinação de fatores. Toda ação é muito ágil e rápida, sendo que os confrontos com os inimigos são bem intensos.O personagem sem nome explora áreas que, em sua maioria, são bem lineares. Há alguns caminhos alternativos e segredos, porém a sensação é de uma experiência mais arcade e direta. A geração procedural de mapas funciona bem e cada partida traz uma sensação de novidade, sempre respeitando as regras de cada uma das regiões: a prisão inicial tem vários corredores interconectados; as torres têm sessões de plataforma; uma espécie de cidadela tem várias armadilhas letais; e assim por diante.
Mesmo perdendo itens e atributos ao morrer, há progressão fixa. Runas dão novos poderes para o personagem, o que permite explorar novas áreas, como seria em um metroidvania. A diferença, aqui, é que essas habilidades permitem acessar outras áreas para cortar caminho ou para buscar mais tesouros, não necessariamente um backtracking. Também é possível desbloquear novos itens para partidas futuras e algumas melhorias passivas (como não perder todo o dinheiro ao morrer). Sendo assim, sempre senti que estava evoluindo, de alguma maneira.
Pela estranha ilha, estão espalhadas várias armas, cada qual com características únicas. As facas são difíceis de usar, porém têm taxa de acerto crítico alta; já o feitiço de gelo é ótimo para parar os inimigos, mesmo sendo bem lento de executar; um chicote elétrico, um dos meus itens preferidos, é ótimo para acertar inimigos distantes, mesmo que o poder de ataque seja bem baixo. Cada partida que joguei foi bem única e diferente por conta da grande variedade de equipamentos e achei especialmente divertido combinar os poderes e experimentar o que funciona melhor em cada situação.
Como a maioria dos roguelikes, Dead Cells é bem difícil. Os inimigos são bem agressivos e poderosos, bastando poucos momentos de desatenção para morrer. A intenção dos desenvolvedores é ter um combate cadenciado, no qual é importante aprender padrões, desviar de investidas inimigas e atacar no momento certo. Na prática, notei que ainda não é o caso e muitas vezes a força bruta e algumas esquivas foram suficientes para dar conta dos monstros — a exceção são algumas versões extremamente poderosas de inimigos, nesses casos precisei de mais estratégia. Porém, achei que o dano é um pouco desbalanceado em alguns momentos, sem motivo algum. Também senti falta de grandes chefes: o jogo usa muito versões “elite” dos inimigos para tentar compensar isso.
Conceitos sólidos e possíveis melhorias
Fiquei impressionado com o polimento de Dead Cells. O jogo acabou de entrar no programa Early Access do Steam, mas a sensação é de que já é um título completo e funcional (assim como aconteceu com Darkest Dungeon na época de seu lançamento). A desenvolvedora diz que por volta de 50% do conteúdo já foi implementado nessa primeira versão e a promessa é muito mais nos próximos meses.Claro, há muito o que melhorar. O combate precisa de balanceamento e inimigos mais interessantes, principalmente no que diz respeito à cadência dos ataques e esquivas. A ambientação e trama são inexistentes, porém parece que há intenção de ter algo nessa linha. Eventuais problemas técnicos e de performance acontecem eventualmente e precisam ser resolvidos. Também senti que a geração procedural cria mapas muito similares depois de algumas partidas, é algo que precisa de ajustes.
Curiosamente, a desenvolvedora Motion Twin classifica Dead Cells como “roguevania com combate souls-like”. É possível ver a influência desses gêneros do jogo, mas elas são bem sutis. Metroidvanias têm grandes mapas labirínticos com partes que só podem ser acessadas após se adquirir certas habilidades, Dead Cells não tem nada disso: as áreas do jogo são bem lineares, com eventuais caminhos alternativos, e não há backtracking. Já o combate é intenso, rápido e brutal, mas não tem a profundidade e cadência de um souls-like — Hollow Knight (PC) é um melhor representante desse estilo. Mesmo assim, não deixa de ser um ótimo título.