Este conceito de cyberpunk é uma coisa que está aparecendo em um bom número de jogos este ano, e nem é algo que saiu de “moda”, para começo de conversa. Eu não quero e nem posso ficar falando muito sobre isso, mas basicamente ele aparece numa obra que contrapõem, de certa forma, avanço tecnológico ao progresso social. É como se a progressão técnica das diferentes ciências fosse incapaz de desenvolver uma ordem social minimamente saudável, até pelo contrário. Aí surgem grupos de rebeldes — os tais punks — que se apropriam desse avanço tecnológico para combater o status quo.
A casa da maioria das pessoas são absolutamente pequenas no mundo do game. |
Cada um dos trabalhos do jogo acompanha o roubo que o grupo realiza em um determinado local. A forma pela qual “vencemos” o cenário é justamente usando um pequeno computador, o Deck, para atribuir comandos aos objetos e equipamentos controlados por uma rede. Você acaba entrando em contato com conceitos bem básicos de programação, já que é necessário escrever códigos simples de comandos. Em pouco tempo mesmo um leigo está escrevendo coisas como "door9.open(3);wait(10);camera2.off(3);wait(5);door9.open(3)" com uma naturalidade que impressiona.
Por mais que possa parecer complicado, o jogo te guia de forma muito clara por essas mecânicas de comando. O bom é que cada novo equipamento é introduzido individualmente em um próximo job. Coisas como um minirrobô controlável, uma maleta com um rifle e uma plataforma de lançamento, acabam agregando mecânicas diferentes que serão necessárias para completar os roubos.
Cada um desses equipamentos se relaciona de forma diferente com o cenário, e conseguem se traduzir em boas mecânicas tendo em vista os desafios de cada fase. Considerando que cada estágio é um roubo, é bastante recompensador conseguir passar rapidamente. Entrar, otimizar sua solução para os problemas, roubar o que for preciso e sair. Quando a coisa acontece de forma veloz, dá aquela boa sensação de que realmente somos essas ligeiras e intrépidas hackers.
Tudo precisa ser direcionado pelas linha de código que você vai digitar no Deck, fazendo com que seja necessário desenvolver uma resolução lógica para concretizar o roubo antes de executá-lo. E, em contrapartida, não é ruim fazer e tentar para então ir conhecendo os limites dos equipamentos e das fases.
Os cenários se apresentam como um puzzle, e o jogador precisa levar em consideração as variáveis e os dados que estão à sua disposição para desenvolver uma solução para o problema. Digamos que você precisa passar por uma área vigiada por câmeras que não permite a entrada do Deck. Será necessário dar os comandos do lado de fora, levando em consideração o tempo que você vai levar bem como a rota que irá percorrer. Esse é um exemplo inicial do jogo, e as coisas ficam mais interessantes conforme os outros equipamentos vão sendo introduzidos.
Existe, de fato, uma linearidade nas soluções, mas os problemas são interessantes o suficiente para que isso não se torne um problema. De qualquer forma, talvez a única coisa que eu tenha sentido falta no jogo foi de mais cenários que possibilitassem o uso da variedade de mecânicas e até mesmo uma liberdade no desenvolvimento de uma solução para o problema/assalto/puzzle.
O último dos roubos é o que melhor congrega o uso dos nossos equipamentos, deixando aos outros trabalhos um espaço de uso da mecânica introduzida neles. Tais espaços para brincar com o novo equipamento do momento funcionam bem. É bem bacana começar a usar, por exemplo, o blink (que te permite atribuir comandos ao piscar dos olhos da personagem) e outras “habilidades”, mesmo que o cenário tenha sido pensado justamente, e de certa forma apenas, para a novidade.
É interessante, também, como estes cenários dão pequenas pistas do enredo, sobretudo em momentos entre as missões. O desenvolvimento narrativo do jogo brinca um pouco com a forma pela qual o gameplay também se dá. Você tem algumas “variáveis e comandos de entrada” e a partir daí constrói algo a partir dos estímulos visuais e sonoros, além, é claro, das missões que está realizando.
Dá para ir conhecendo as personagens através de fotografias e visitando a própria casa delas em determinados momentos. O jogo dá uma atenção especial para a forma como o visual e os objetos que você encontra vão construir a atmosfera e o seu mundo. Em alguns momentos, principalmente um no começo e um no fim, eu fiquei impressionado, e emocionado, pelo uso de um espelho no cenário. É uma opção singela, aparentemente pouco impactante, mas que consegue criar uma aura de beleza e emoção dentro da obra.
Falando em coisas belas, certa vez eu fui em um show, nada cyberpunk, de uma cantora. Lá pelo fim do evento, o pessoal pedia desesperadamente para que ela cantasse uma determina música. Ela começou a cantar, e só fez o comecinho, deixando o público cantar sozinho o restante da canção. Quadrilateral Cowboy possui uma área em seu menu dedicada a Mods, figura na oficina do Steam e também está com seu código aberto. Talvez ele queira justamente ter iniciado uma bela obra, deixando espaço para que agora, quem quiser ou puder, crie algo a partir dela também. Acho um passo bonito para um game que se conecta, em diversos aspectos, de forma emocional com seus jogadores.
Quadrilateral Cowboy se constrói a partir de uma interação interessante entre o jogo e o jogador. O último vai absorver o que é dado pelo primeiro, e a partir daí construir sua relação mecânica e narrativa com o game, mesmo que sendo guiado em grande parte do processo.
Prós:
- Aspecto central do gameplay é instigante;
- Mecânicas vão sendo introduzidas em um bom ritmo;
- Visual que compõem a atmosfera da jogabilidade e da narrativa;
- Cenários bem construídos para as habilidades e equipamentos serem utilizados.
Contras:
- Alguns cenários com mais possibilidade de usar as diferentes mecânicas de forma mais livre poderiam enriquecer a experiência.
Quadrilateral Cowboy — PC — Nota: 9.0
Revisão: Vitor Tibério