Undertale (PC) e a fantasia do poder

O jogo indie Undertale é um passo importante para os videogames como mídia.

em 10/07/2016

Empatia é a sensação intangível que sentimos uns pelos outros. Muitas vezes, ela é confundida com “pena”, mas, na verdade, não tem relação nenhuma. Sensibilizar-se pelo próximo é, talvez, uma das melhores coisas que você possa fazer como ser humano mesmo.


Dito isso e entrando na velha discussão “seriam videogames arte”, conseguimos um novo tópico a partir da empatia. Onde ela se encontra nos jogos? Como ela se apresenta? E, nesse momento, um dos gêneros que mais vem a cabeça de quem acompanha a indústria é um bem famoso: o RPG. A trajetória e a jornada de diversos personagens geralmente é confeccionada de tal forma que os nossos sentidos empáticos são ativados por ela. Apegamo-nos aos personagens e, pouco-a-pouco, vamos compartilhando do que eles sentem. Mas, de certa forma, sempre fazemos isso apelando para a violência, não?

Sim, sempre segurando uma espada, pistola ou coisa do tipo, nossa jornada acaba sobre uma quantidade absurda de corpos. Talvez seja parte da fantasia de poder que os jogos, em sua essência, tentem a acompanhar, ou talvez seja simplesmente um recurso para tornar o jogo interessante. E é aí que Undertale entra.
Essa imagem promocional de Shadows of Mordor representa muito bem a tal fantasia de poder. 
A proposta de Undertale em sua chamada “Run Pacifista”, uma forma de jogar a campanha principal do jogo sem matar ninguém, seria algo não possível se a mídia videogames não tivesse evoluido tanto. A fantasia de poder é algo presente em mitos primordiais e até nas primeiras obras de grandes autores; ela é um desejo subconsciente que enaltece e realiza tudo o que o homem quer em sua essência mais básica. De certa forma, o ato de usá-la é um ponto seguro que teremos algo que irá ser recebido de forma positiva e de fácil compreensão. Os videogames, em seu começo, vendiam-se totalmente nisso. Os primeiros Final Fantasy, Dragon Quest e muitos outros jogos são um simples copiar e colar das características desse recurso, apresentados com roupagens diferentes.


E no começo dos videogames, não poderia ter coisa melhor que ser um assassino sem perceber. Não que você mate sendo mal ou coisa do tipo, você mata pois são desafios de sua jornada. Só que, será que não teria outra opção? Ter outra opção é sair da fantasia de poder, e por isso talvez tenha demorado tanto para algo como Undertale aparecer. É um medo sincero que, no fim, o consumidor compra algo com um desejo não consciente de vivenciar a fantasia do poder. Por mais que muitos artistas só queiram mostrar suas visôes a partir do jogo, ele ainda é um produto e precisa ser vendido. E sair dessa fantasia pode causar conclusões terríveis financeiramente.

No fim, não estou sugerindo que o fato de Undertale apresentar uma opção de não-matar é algo fantástico, mas sim que isso irá mudar a indústria. Eu não quero, daqui há 20 anos, estar escrevendo um texto enaltecendo um jogo que usa a fantasia do poder em um mar onde a coisa mais comum são situações empáticas. Eu enalteco Undertale, pois ele soube o momento em que ele apareceria e saberia o que fazer. Desde a meta-linguagem até seus discursos progressistas, ele é o jogo que a indústria dos videogames precisava nos anos 2010.

Revisão: Jaime Ninice

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
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