Análise: Armello (PC/PS4) é um ótimo jogo de tabuleiro em formato digital

Use cartas e dados para conquistar o trono nesse indie que combina vários estilos diferentes.

em 18/02/2016
Armello é um título indie para PCs e PS4 que tem uma premissa interessante: trazer a experiência de um jogo de tabuleiro para o meio digital de forma acessível e única, aproveitando-se de recursos que só podem ser utilizados nessa plataforma. Como amante de aventuras de tabuleiro, fiquei muito curioso quando soube da existência do jogo e de suas promessas. Depois de inúmeras partidas, concluí que Armello tem qualidades suficiente para agradar tanto amantes de títulos de estratégia quanto aqueles que gostam de jogos de tabuleiro.

Disputando o trono

O rei de Armello foi corrompido por uma força nefasta chamada de Podridão, que consome sua sanidade e saúde pouco a pouco. Cada dia mais louco, o monarca, que é um imponente leão, espalha terror e medo pelo reino. Por conta disso, os quatro grandes clãs de Armello julgam o rei indigno e enviam heróis para reclamar o trono. Sendo assim, os representantes dos clãs lutarão entre si a fim de se tornarem o novo rei.

A ambientação do jogo segue a linha fantástica, com animais antropomórficos como personagens, e funciona muito bem. Existe, também, uma pitada de política: cada clã planeja tomar o trono de maneiras distintas, das quais algumas não envolvem força física e nem conflito. A premissa é interessante, mas infelizmente a trama e as motivações dos heróis são pouco desenvolvidas e acabamos só conhecendo o mínimo — o que é uma pena, pois o universo é convidativo e interessante.

O universo de fantasia é complementado pela ótima direção de arte. A personalidade dos heróis é facilmente identificável com o visual: o lobo sério e justo, o rato melindroso e furtivo, a coelha fofa e inquieta. Destaque também para as cartas, que possuem belas ilustrações animadas.

Cartas e dados para explorar o reino

Não basta ter uma ambientação interessante, belas artes e cartas animadas se as partidas são enfadonhas. Felizmente Armello oferece maneiras interessantes de se usar as cartas e outros recursos. É um pouco difícil definir exatamente o que esse título representa como um jogo, já que ele mistura várias mecânicas de gêneros diferentes — a sensação que eu tive foi a de que ele é um misto de estratégia, RPG e tabuleiro. Os heróis alternam turnos enquanto exploram um tabuleiro dividido em espaços hexagonais realizando missões, coletando tesouros, enfrentando oponentes e melhorando atributos.

As ações são feitas utilizando-se cartas de diferentes funções, que se dividem em itens, feitiços e trapaças. Atributos dos heróis definem o uso das cartas e o tamanho da mão: um personagem com um valor elevado de espírito consegue lançar mais feitiços, o dinheiro permite o uso de itens e trapaças, já a inteligência define quantas cartas o herói pode carregar. O combate é frequente em Armello e ele acontece por meio de lançamento de dados — uma espada representa um ponto de ataque, um escudo aumenta a defesa e assim por diante. As cartas podem ser queimadas para que seja possível definir algumas faces dos dados, o que ajuda a diminuir o fator sorte e traz mais estratégia aos confrontos.


Algo interessante são as condições de vitória, que podem ser alcançadas de várias maneiras diferentes. A mais simples delas consiste em derrotar o rei em combate, sendo este o método mais direto de vencer. A opção política consiste em realizar feitos pelo reino, acumular Prestígio e esperar o monarca morrer, tudo isso sem sujar as mãos. Purificar o rei de sua Podridão, com a ajuda de pedras espirituais, é uma alternativa nobre. A última opção consiste em se corromper mais que o rei e tomar o seu lugar. Contudo, essas condições de vitória não mudam drasticamente o andamento básico das partidas e algumas delas acabam acontecendo com maior frequência. O resultado é uma leve sensação de que as partidas são bem similares.

Pode não parecer em um primeiro momento, mas o jogo oferece várias opções estratégicas e te dá espaço para tentar coisas diferentes. Isso se dá, principalmente, por meio dos heróis: cada um deles apresenta atributos e habilidades específicos, o que facilita tentar alcançar determinados tipos de vitória. O lobo Suserano, por exemplo, tem alto poder de ataque, o que facilita derrotar o Rei; já a ratinha Zoya é versada em furtividade e é ideal para coletar Prestígio; e assim por diante. Reviravoltas costumam acontecer durante as partidas e tudo pode mudar de um turno para o outro. Mas isso não é problema: basta usar as cartas de trapaça, algum feitiço ou até mesmo derrotar os outros heróis em combate para tentar mudar o andamento da partida. Adaptar-se, avaliar as situações e usar com inteligência as cartas e habilidades, é essencial para vencer.

Decretos reais podem mudar o rumo da partida

Jogando sozinho e em grupo

Armello tem várias regras e detalhes e pode parecer confuso a princípio, mesmo com a presença de um prólogo que serve como tutorial e e um menu de ajuda. Confesso que no começo eu não entendi muito bem o que estava acontecendo, mas depois de algumas partidas eu me familiarizei com os sistemas e a experiência se tornou bem prazerosa — as nuances das mecânicas ficam mais claras com a repetição. A variedade de situações é grande, o que torna cada partida única. Reviravoltas acontecem o tempo todo, o que força a troca de estratégia.

Jogos de tabuleiro são criados com foco em partidas em grupo. Contudo Armello conta com um modo para um único jogador. Nele os oponentes são controlados por inteligência artificial de dificuldade moderada. Já no multiplayer é possível enfrentar amigos e desconhecidos por meio da internet — nada de partidas locais aqui. Encontrar jogadores é complicado e leva-se muito tempo, por sorte é possível jogar sozinho enquanto espera por uma sala. Chamar amigos é a melhor maneira de fazer partidas online, já que não existe tempo de espera.


Confesso que não gostei muito das partidas online. O motivo disso é que o ritmo da ação é muito lento e passa-se mais tempo assistindo às jogadas dos outros do que efetivamente jogando — enquanto uma partida contra o computador leva uns 30 minutos para ser concluída, um jogo multiplayer consome uma hora e meia ou mais. Para piorar, as alternativas de comunicação são extremamente limitadas: somente frases prontas em um menu, como em Hearthstone. O resultado são partidas que se arrastam. Com certeza o multiplayer com os amigos deve ficar mais divertido em conjunto com alguma ferramenta de comunicação, como Skype ou Party do PS4.

Outro ponto decepcionante é a pouca variedade de modos e regras. O jogo conta somente com uma única modalidade, que funciona de maneira igual sempre. Até é possível customizar levemente as partidas com as chamadas “Regras da Casa”, mas as opções são bem limitadas e de pouco impacto. Felizmente os desenvolvedores já estão cientes disso e prometem mais opções em uma atualização futura — torço para que sejam significativas. Acredito também que não existir um modo história ou algo parecido foi uma oportunidade perdida, afinal, o universo e ambientação são ótimos e seria interessante que esses aspectos fossem mais explorados.

Variedade e características familiares

Mesmo sendo um pouco repetitivo por conta das limitações das regras, eu continuei querendo jogar mais e mais partidas de Armello. O motivo disso é que ele é um jogo bem divertido e repleto de situações diferentes. A cada nova partida eu tento uma vitória diferente: em uma o meu objetivo é assassinar o rei, em outra eu prefiro acumular prestígio e fama, e assim por diante. Gosto também de sempre jogar com personagens diferentes, pois a experiência e as estratégias mudam sensivelmente de acordo com o herói. Só senti falta de um pouco mais de interação entre os participantes: o jogo nem sempre sugere conflito ou aliança entre as partes.
As cartas têm belas ilustrações animadas
Jogar Armello foi uma experiência familiar, pois ele realmente usa várias características de jogos de tabuleiro que eu já joguei. A disposição do cenário e a queima de cartas para garantir certas ações me lembraram muito o Mage Knight Board Game e o combate com dados parece com o de Mice and Mystics e Star Wars X-Wing. Durante as partidas, sempre pensei que o título poderia ser perfeitamente adaptado para um jogo físico facilmente, apesar de Armello se beneficiar de recursos eletrônicos como contagens automatizadas de atributos, oponentes controlados por inteligência artificial e efeitos visuais interessantes — gosto especialmente das ilustrações animadas das cartas.

Uma bela aventura

Armello é um ótimo jogo que lembra um híbrido de RPG e tabuleiro. O título é construído com esmero e possui visual, temática e direção de arte excelentes. As regras de jogo podem ser confusas no começo, mas bastam algumas poucas partidas para entender tudo e se divertir. Os principais pontos negativos são a pouca variedade de modos e a pequena possibilidade de customizar as regras. O multiplayer online funciona, mas o ritmo lento pode deixar a experiência meio cansativa. No mais, Armello é uma ótima escolha para aqueles que gostam de estratégia e jogos tabuleiro.

Prós

  • Mecânicas de jogo bem pensadas e divertidas;
  • Ótimo visual e direção de arte;
  • Grande variedade de situações durante as partidas;

Contras

  • Poucos modos de jogo;
  • Multiplayer online apresenta ritmo lento.
Armello — PC/PS4 — Nota: 8.0
Versão utilizada na análise: PC
Revisão: Érika Honda

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
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