Recebidos os códigos de acesso e lidas as regras do embargo (um conjunto de condições para os redatores de um jogo se guiarem), instalo a expansão à minha biblioteca da Steam. Mas não encontrei o título na lista, e ao entrar no já instalado Beyond Earth, não encontro nada de novo em relação ao DLC. Estranho.
Volto à biblioteca da Steam e encontro o curioso jogo Amazing Thai Food instalado. Deixo minha xícara de chá de lado e, confuso, revejo todos os passos da instalação e os arquivos passados. Só depois de alguns minutos fiz a conexão: no embargo para o preview do jogo, só nos foi permitido jogar com Han Jae Moon, um novo líder de expedição, que como o próprio nome indica, é asiático. Faz todo sentido, 2K!
Um mar de novidades
O mote para a primeira expansão do futurístico Sid Meier's Civilization: Beyond Earth é a água. E como este elemento está mais presente do que nunca, senhoras e senhores!Se no vanilla, Beyond Earth temos oceanos como um mero obstáculo a ser atravessado para se chegar do ponto A ao ponto B, com um ou outro monstro alienígena para atrapalhar a travessia, agora em Rising Tide temos tanta ação nos mares quanto em terra. A fundação de cidades na água cria novas estratégias, oferece tantos recursos quanto em solo e possui um mecanismo diferenciado: ao invés de expandir seus limites territoriais de forma automática, as cidades flutuantes precisam se mover para crescer.
É como ter uma casa-barco: "se não gosta de onde está, é só levantar âncora!". Apesar da movimentação ser lenta e gastar preciosos turnos para a ação, os hexágonos de sua cidade mantêm-se onde estavam e ampliam o território para onde quer que a cidade vá. Essa praticidade toda possui um preço: com poucos tiros de um navio, a cidade despenca e pode ser tomada facilmente. Venci uma civilização rival inteira com um punhado de cruzadores e uma corveta.
O domínio nos mares, então, se torna peça fundamental da sobrevivência de uma partida, algo que a IA não levou tanto em consideração nas longas 6 horas de uma campanha, e mesmo assim perdi de forma surpreendente.
Amigos, amigos; negócios e tratados de paz à parte?
As novidades não se resumem ao domínio do homem aos oceanos de outros sistemas solares. Mudanças radicais em diversos sistemas do jogo têm como necessidade apaziguar as frequentes (e justas) críticas que Beyond Earth sofreu desde o seu lançamento, além de incluir algumas novidades aqui e ali e um punhado de novas facções (os sponsors).O novo sistema de diplomacia trouxe mais uma moeda de troca para o 4X: pontos de diplomacia permitem agora abrir novas perks que auxiliam na administração de sua colônia espacial. Com eles, também é possível negociar trocas destas perks com outros jogadores, criando laços mais poderosos entre as facções e gerando um crescimento político, econômico, cultural e mesmo diplomático. Para quem está habituado a edições anteriores de Civilization, pense nesse sistema como uma mescla de religião e ideologia.
Como curiosidade regional, nosso representante do futuro agora está próximo a se tornar rei, se depender de seu sobrenome, que aumentou. Agora chama-se Rejinaldo Leonardo Pedro Bolivar de Alencar-Araripe. Além disso, posso dizer que ele enlouqueceu. Se na versão vanilla temos uma IA ponderada na ofensiva e pouco presente em qualquer partida, agora precisamos tomar cuidado com as bruscas mudanças de personalidade do líder de Brasilia. Em três oportunidades não sequenciais, entramos em guerra, mesmo estando do outro lado do mundo, inalcançável e sem motivo aparente para ser um perigo a ele (ou ele a mim).
Claro, em duas dessas vezes fui forçado a entrar em guerra, e devo isso a uma das mudanças bizarras no sistema de diplomacia da qual já estávamos acostumados a usar desde os primórdios de Civilization.
Ao invés de criar laços de amizade, denunciar ou declarar guerra a outro jogador, temos agora uma barra com cinco pontos para cada líder no jogo, começando do "estado de guerra" ao outro oposto, "aliados", passando por "sancionado", "neutro" e "cooperação", numa tradução livre dos termos. Esses pontos podem ser mudados dependendo de duas novas variáveis incluídas: medo e respeito. Ter um enorme exército, grandes rotas comerciais ou uma vasta rede de satélites, entre outros atributos, ajudam a manter uma boa imagem frente aos outros jogadores.
Mas mesmo com esta revolução na IA, suas personalidades continuam pouco marcantes, diferente dos famosos ícones históricos que vemos noutros títulos da franquia. Por mais interessante que seja receber mensagens personalizadas de alguns sponsors, dependendo de quem estiver jogando, ainda não se nota mudanças significativas neste que é uma marca registrada dos outros Civilizations.
Se antes tínhamos três estágios de relacionamento com outro líder (guerra, neutro ou aliado), agora temos que nos preocupar em sempre manter esses cinco pontos num nível adequado, tomando cuidado com quem aceitas por aliado ou inimigo.
Digo isso pois ao mudar as relações de "cooperação" para "aliados", ambas as civilizações aliadas entrarão em guerra caso uma das partes ataque alguém, ou seja atacado. Diferente do velho e quase inutilizado "Defense Pact" em Civilization V, que precisava ser ativado para essa condição de defesa mútua, os aliados em Rising Tide entram automaticamente em guerra, por vezes ruindo um status de cooperação lucrativo e promissor. Foi isso que aconteceu entre minha civilização e Rejinaldo. Duas vezes.
Além disso, a interface para acordos comerciais e de paz foram cruelmente excluídos. Ao invés de negociar individualmente cada precioso recurso com outro jogador, cada parte ganha estes recursos automaticamente quando uma Trade Vessel ou Trade Convoy é ligada entre duas civilizações. Um status diplomático "sancionado" corta automaticamente esses laços comerciais, remetendo às sanções votadas em assembleias em Brave New World. Por um lado, isso economiza um bom tempo quando se precisa de alguns recursos ou quando se precisa vender o excedente produzido.
Por outro lado, o sistema de negociação de paz acabou com a diversão que uma guerra vitoriosa traz. Quando se abre a janela de diplomacia de outro líder, um score pontua a situação geral do conflito, e um veredicto que por vezes soa falacioso: ele contabiliza o número de unidades destruídas e cidades tomadas, e aponta quem está ganhando. No final da minha terceira guerra com Rejinaldo, a coisa estava humilhante: uma dominação de 4000 a 400, com minhas tropas de tanques flutuantes, drones, navios e aeronaves cercando Santo Adrião, último bastião do militar canarinho no planeta.
Nas versões anteriores de Civilization, as negociações de paz envolviam, por vezes, indenizações e até mesmo a cessão de cidades para apaziguar os ânimos. Nesta nova versão, uma janela mostra quem está dominando e determina o que a civilização derrotada precisa ceder para ter paz. Não há mais escolha do que o vitorioso quer ganhar, se quiser ganhar algo. Numa batalha entre meus coreanos do espaço e os ARC (e meu total controle dos mares), uma das negociações determinava a entrega de todas as cidades ARCianas, com exceção da capital, quando na verdade queria somente minha cidade conquistada de volta, mais uma cidade de uma terceira facção envolvida no conflito. As negociações de paz foram para o espaço.
Ainda não sei se isso serve para desestimular guerras, ou para torná-las mais decisivas e brutais. Só sei que não encontrei formas de acabar com conflitos sem que para isso precise destroçar completamente a outra facção, e isso, damas e cavalheiros, é horrível.
Senhor, pode tirar a sua lagosta da minha lagoa?
Rising Tide traz uma enorme quantidade de novas unidades para satisfazer os sedentos por conquista. As mais interessantes são as unidades híbridas, que usa as duas mais altas afinidades alcançadas pelo jogador para desbloquear criações únicas, mesclando habilidades e criando poderosas combinações de armas. Minha favorita até agora é uma espécie de forno flutuante, que atira bolas de plasma nos pobres oponentes, híbrida de Harmony com Purity.Além das unidades híbridas, temos também novos tipos de alienígenas, variando de forma e principalmente de tamanho. Se um Kraken te assusta, espere até encontrar as lagostas gigantes, que podem transitar tanto por terra quanto por mar, sem falar das asustadoras colônias gigantes de poríferos com tentáculos comedoras de gente.
Essa variada em monstros do espaço, além de variar os encontros, é motivo de disputa pela caça: em certo momento do jogo, você pode capturar algumas criaturas e usá-las a seu bel-prazer. Outro incentivo para o extermínio sem controle dos nativos são os artefatos, que por vezes podem ser encontrados nos ninhos dos alienígenas. Apenas um desses dá uma boa quantidade de recursos para seu império; e juntando três, se desbloqueia habilidades ou construções únicas deste novo microgame.
Civilization: Beyond Earth: Rising Tide é uma extensa tentativa de reaproximação dos jogadores ao título. Antes uma simples releitura de Civilization usando a temática espacial, com algumas novidades aqui e ali, nada se comparava à extensão do que já tínhamos com Brave New World. Com a expansão, temos tantas novidades que por vezes chega a cansar, de tantos ajustes e estratégias possíveis de serem concebidas. Infelizmente, um dos mais criticados sistemas, o de vitórias, não sofreu mudança alguma. Para se vencer, ainda é necessário criar enormes e demoradas construções e por vezes perder mais turnos esperando ela ser ativada, indiferente da afinidade escolhida. Há alguns bugs a serem consertados (alguns ainda herdados da versão anterior), mas no geral, o título ainda precisa de algo mais para ter vida própria e se distanciar dos velhos e históricos Civilization.
Rising Tide (Civilization: Beyond Earth) — PC — Nota: 8,0
Revisão: Alberto Canen