Giants: Citizen Kabuto (PC/PS2): um mundo repleto de ação, (muita) violência e humor

Pouco conhecido pelo público, o título trazia uma história divertida, aliada a uma ótima jogabilidade .

em 23/10/2015

No início deste ano, eu cometi um grande erro: comprei Resident Evil 6, apesar de todas as péssimas análises e sinais de que aquilo era errado. Arrisquei e acabei desperdiçando mais de 20 horas da minha vida. Dentre as centenas de pontos fracos do jogo, um dos maiores, para mim, era sua campanha fragmentada. Dividida entre quatro protagonistas e com focos distintos em cada uma, na teoria, seria uma boa ideia. Na prática, o desbalanceamento de qualidade entre cada uma delas fez vários momentos parecerem uma grande tortura. Mas nem sempre um jogo com campanhas fragmentadas será ruim, claro. E para mim, o melhor exemplo que já joguei é Giants: Citizen Kabuto.

Não faz ideia de que jogo seja esse? Eu também não fazia quando o comprei. Vamos a um breve histórico. Era início dos anos 2000, onde a internet discada era o ápice dos fins de semana, computadores com 512mb de RAM se equivaliam aos da NASA e jovens usuários de PC, como eu, adoravam encontrar jogos leves e baratos em lojas de varejo variadas. Giants logo chamou minha atenção e, mais de dez anos depois, ele ainda é um dos meus jogos favoritos.

Um estranho novo mundo

Ambientado em um planeta tropical, mas com regiões nevadas, o jogo se inicia com um acidente envolvendo alguns soldados alienígenas da raça Meccaryns (não existem humanos na história), em que o personagem controlado pelo jogador, Baz, se perde de seus companheiros e precisa reencontrá-los. Partindo dessa premissa, o jogo se desenvolve por uma variedade um tanto limitada de cenários, mas com objetivos interessantes, como resgatar a esposa de um dos habitantes do planeta. Um dos pontos mais marcantes do título está justamente na forma com que sua história é contada. Os personagens possuem diálogos hilários e por vezes com fortes doses de humor negro envolvendo violência e morte. Em dado momento, um dos habitantes é devorado e, apesar de ser um momento triste por ser um personagem querido, logo estamos rindo novamente quando ele reaparece em forma de espírito.

Por padrão, a jogabilidade nas três campanhas é na visão em terceira pessoa, mas pode ser facilmente trocada para em primeira pessoa, apesar de que, ao menos para mim, esse modo prejudica um pouco a experiência geral. Por conta da grande quantidade de inimigos, ter a visão limitada a apenas uma direção pode fazer com que os personagens sejam alvejados sem saberem por quem ou por onde. O combate varia de acordo com a campanha jogada: os Meccaryns atacam à distância utilizando sua grande variedade de armamentos, Delphi pode usar sua espada (que possui dano absurdo) ou vários arcos com efeitos distintos. Por último, mas não menos empolgante, temos Kabuto e seus ataques desengonçados, mas assustadoramente destrutivos. 

Os modelos dos personagens são variados de acordo com a raça a qual pertencem. Durante as três campanhas, enfrentaremos inimigos em comum, mas certos tipos aparecem apenas em partes determinadas. Alguns lembram bastante a forma humana, como Baz e seus companheiros, enquanto outros, em sua grande maioria, são comicamente horrendos.

Histórias cruzadas

Durante a campanha de Baz, temos acesso a um grande número de armas com efeitos comuns, mas variados. Pistolas, rifles de assalto e algo que parece um lançador de bombas atômicas portátil fazem parte da lista de armamentos disponíveis para eles. Outros itens também vão surgindo à medida em que a história avança, como mochilas a jato e capas de invisibilidade, mas com exceção de alguns itens, é possível jogar sem utilizar dessas opções.

A história de Baz e seus quatro companheiros é a que chama mais a atenção devido a seu humor constante e momentos de ação interessantes. Em sua parte final, você se torna responsável por montar uma base e mantê-la segura, sendo esse o momento mais interessante e desafiador da campanha. Durante essa parte, já testamos quase tudo que Baz tem a oferecer, mas ainda assim o jogo exige bastante habilidade do jogador para realizar todas as ações de forma eficiente e manter a integridade da base. É possível controlar os companheiros de Baz para que eles protejam ou ataquem algumas áreas, mas a inteligência artificial é fraca e eles morrem com facilidade. 

Após essa etapa, damos início à campanha da princesa da raça Sea Reaper, Delphi. Com pele azul e agilidade superior a de qualquer outro personagem, sua campanha se diferencia da de Baz pelo aspecto individualista. Enquanto que com o soldado tínhamos seus companheiros quase sempre ao nosso lado, Delphi é mais um “exército de uma mulher só” e enfrenta inimigos extremamente desafiadores com uma gama de movimentos interessantes. Essas habilidades são desbloqueadas com a ajuda de uma espécie de conselheiro/curandeiro/louco que habita a região onde a Sea Reaper vive. Por conta de sua raça ser bastante ágil, suas habilidades se refletem no uso de sua espada, uma grande variedade de arcos e poderes que afetam alguns alvos ou todo o campo de batalha. É possível, também, recuperar HP ao entrar na água, uma estratégia que pode salvar sua pele em vários momentos.

A violência é um aspecto recorrente durante o jogo. Quando se explode um inimigo, seu sangue fica manchado no chão. Ao controlarmos Delphi, sua espada promove um verdadeiro banho de sangue, o que, em conjunto com seu poder que lhe dá um salto gigantesco, faz dela um personagem temível no campo de batalha. Sua personalidade é séria e destoa completamente do tom da campanha anterior, mas os coadjuvantes presentes conseguem manter um padrão nesse quesito. Assim como Baz, Delphi também constrói uma base em determinado momento, mas a imersão nessa segunda empreitada não é tão intensa quanto com os Meccaryns.

O fator comum nas duas campanhas é o ressurgimento iminente do monstro Kabuto. Gigantesco, veloz e praticamente um sinal de morte certa, Kabuto se torna o protagonista da terceira campanha. Começando com um tamanho relativamente pequeno e com pouca resistência a dano, o jogador deve cumprir uma meta de devorar alguns habitantes da ilha. Quando essa meta é atingida, Kabuto cresce até atingir seu tamanho máximo e ignora boa parte dos ataques que recebe.

Diferentemente dos outros personagens, Kabuto não possui quaisquer aliados, por conta de sua natureza brutal. Seus únicos companheiros durante a jogatina são dois filhotes que servem, fundamentalmente, para serem distração enquanto você ataca os alvos principais. Por não usar armas, o monstro possuía pouca variedade de ataques, mas que eram bastante eficientes e produziam efeitos de destruição interessantes no cenário, como quando Kabuto saltava e atingia o chão, gerando uma grande onda de choque.

Um ponto negativo é a falta de variedade das localidades. Com exceção da campanha de Delphi, todos os demais ambientes são semelhantes: vilarejos, praias, montanhas e pequenas ilhas, sempre com a mesma vegetação. Ainda assim, o design delas é diferente o suficiente para que a locomoção entre cada uma exija um pouco mais de atenção sobre seus recursos, como a potência do jetpack ou dos longos saltos de Delphi. A cada fim de capítulo, somos levados a uma área diferente, onde o jogador tem a liberdade de explorar um pouco o mapa, correndo o risco de ser atacado, ou ir diretamente para o objetivo daquela etapa.

Pouco reconhecimento

Por parte da crítica especializada, o jogo recebeu boas notas na época de seu lançamento, recebendo, inclusive, alguns prêmios, além de uma versão para PlayStation 2. Contudo, o baixo número de vendas fez com que o título fosse pouco lembrado pelos jogadores e uma eventual sequência jamais ocorreu.

Neste ano, um dos criadores originais do jogo, Nick Brulty, anunciou uma campanha no Kickstarter do jogo First Wonder, que seria o “sucessor espiritual” de Giants. Após arrecadar mais de 46 mil dólares dos 500 mil necessários, a campanha foi cancelada no dia 17 de outubro. Em nota, a Rogue Rocket Games, responsável pelo título, informou que tomou a decisão com base na pouca arrecadação. A produtora garante que seguirá trabalhando no jogo, em busca de melhorias e aumentar sua gama de jogadores.

Mesmo com o pouco reconhecimento, Giants: Citizen Kabuto conseguiu unir de forma exemplar uma história bem contada com muita ação e jogabilidade sólida. Claro, existem milhares de títulos com aspectos semelhantes, como Max Payne, a série GTA ou Enslaved, mas Baz, Delphi, os inúmeros momentos hilários e todo aquele planeta curioso certamente são capazes de cativar qualquer jogador que entre em seu universo.

Revisão: Alberto Canen
Capa: Daniel Serezane

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