O nascimento de uma obra-prima
Inicialmente, o lançamento do jogo foi marcado para novembro de 1997. No entanto, já era setembro e após muito trabalho o time percebeu que o jogo que fizeram era uma versão melhorada e “morta” de Quake.O título possuía elementos dignos de um jogo de sucesso, como monstros interessantes, níveis legais e tecnologia bacana. Porém, por mais divertidas que fossem separadas, as peças desse quebra-cabeça não formavam um bom jogo quando eram unidas. Em vez de corrigir os erros do projeto que já tinham em mãos e entregar o produto final às prateleiras com alguns meses de atraso, eles optaram por refazê-lo completamente. O que o futuro lhes guardava era imprevisível, mas ao menos iriam produzir algo que agradasse a todos na equipe.
"O senhor pode me dizer onde é a junta militar?" |
O segundo passo do processo foi analisar o que havia de diferente no que haviam feito, que seria um atrativo para o jogador. Três teorias foram formuladas pela equipe durante a análise: uma defendia que conteúdo deveria ser destravado pelo jogador na medida em que ele avançasse no jogo, assim, suas ações teriam uma consequências e não iriam fugir de seu controle; a segunda defendia que o mundo oferecido pelo jogo deveria interagir com o jogador e suas ações; a última, mas não menos importante, defendia que o jogo deveria alertar o jogador em caso de dano ou perigo, assim ele iria considerar a falha sua culpa e trabalhar para superá-la.
No entanto, o terceiro e um dos mais importantes passos dado pela equipe foi a criação da cabala, que é considerado um dos motivos do tamanho sucesso de Half-Life. Tratava-se de um grupo de pessoas formado pelos desenvolvedores para desenvolver um documento relatando todos os mínimos aspectos do jogo. Eles decidiam quando e onde um NPC, monstro ou arma seria introduzido no decorrer da obra. Muito do que fora introduzido meticulosamente nesses documentos fora decidido em reuniões de “brainstorm” voltadas para partes específicas do título. A tarefa era dividida entre os membros do grupo: um gravava e transcrevia as ideias no papel, outro trabalhava com as ilustrações explicando layout e detalhes do projeto.
Uma das artes conceituais feitas pela Cabala |
Mecânicas recicladas
Não havia algo muito diferente em Half-Life quanto às mecânicas, porém, as mesmas foram reinseridas no jogo de uma forma meticulosa. Um exemplo são munições e armas: você as encontra em corpos, de soldados ou seguranças, espalhados pelo ambiente ou em um armário. Isso é proposital, pois dá uma certa lógica ao jogo e se encaixa ao enredo de alguma forma, faz você sentir que existe um “toque de realismo” enquanto joga.Outro exemplo é a sua armadura: H.E.V suit Mark IV, que fora desenvolvida para a proteção em ambientes e de materiais perigosos. Isso explica por que você sofre apenas dano ao invés de morrer instantaneamente com radiação, eletricidade ou gases nocivos. Isso torna ainda mais lógico o motivo pelo qual a energia do traje deve ser constantemente carregada. Em outras palavras, nada de salas vazias com itens, e uma dúvida à sua espera: “de onde foi que eles vieram?”.
Um dos momentos mais épicos do jogo. |
O molho secreto
Na experiência proporcionada por Half-Life, a melhor parte foi a narrativa. Ela era simples e complexa ao mesmo tempo, mas também o coração da obra. Tudo gira em torno da história, mas, diferentemente de outros jogos, nenhuma cutscene atrapalha sua aventura.Inicialmente, a única informação que o jogo te passa é simplória: você é um cientista. Claro que algumas informações básicas como o nome do protagonista são reveladas, mas nada além disso. Elementos do cenário, NPCs, monstros e diálogos revelavam a trama na medida em que você avança no jogo.
Corrigindo: você é só o estagiário e eles os chefes, por falar nisso, cadê meu café? |
Outro exemplo dos diálogos de personagens, cuja existência é um mistério e a importância na trama é imensa: G-man e Nihilanth. Alguns dos elementos que envolvem o enredo só ganham sentido ou são revelados em outros jogos da série, como Opposing force (PC), Blue Shift (PC), Decay (PS2, PC) ou até mesmo Half-Life 2 (Multi). Outros jogos da Valve, como Portal (Multi), sugerem que a história por trás de Half-Life possui uma ligação, o que implicaria dizer que todos os títulos da companhia coexistem em um único universo.
"Gordon Freeman in the flesh." |
Um presente para nova geração
Half-Life influenciou em muito alguns jogos da nova geração. Exemplo de Far Cry 4 (Multi), lançado recentemente pela Ubisoft, no qual um mundo foi concebido para que o jogador pudesse explorá-lo. Certamente Kyrat e a Black Mesa (um dos ambientes onde HL se passa) são bem diferentes, mas isso não muda o fato que foi deixado à disposição do jogador um ambiente que revela traços do enredo na medida em que ele avança.Outro ótimo exemplo é o ultimo título lançado da franquia Call Of Duty, Advanced Warfare. Em algumas das missões do jogo, é possível escolher a abordagem que quer utilizar, o que antes só era possível de uma forma mais “pobre” no modo multiplayer. Em Half-Life era possível partir para a ignorância e atirar para todos os lados, ou simplesmente agir com mais cautela, esconder-se e até escutar os diálogos de NPCs.
Tão convidativa quanto a Black Mesa. |
Half-Life é muito mais do que grande marco na história do jogos, ele é uma obra-prima revolucionária, que moldou gerações que vieram depois dele e ainda tem muito a ensinar para a oitava geração de consoles. Esse jogo definitivamente merece a importância que carrega e deve ser devidamente apreciado.
Revisão: Alberto Canen
Capa: Diego Migueis