GameBlast: Poderia nos contar um pouco sobre você? Como começou a empresa e de onde surgiu essa ideia de vender créditos para jogos?
Christian Ribeiro: Basicamente, o Boa Compra surgiu a partir de uma necessidade dos jogadores brasileiros. Em 2003, nós começamos a jogar um MMORPG chamado Tíbia e a gente verificou que tinha muito brasileiro jogando, mas ninguém se interessava em comprar os produtos que eles comercializavam, na época chamado de Premium Account. E a maioria dos fansites falava: "a versão gratuita é legal, você não precisa jogar a versão premium para se divertir". E a gente chegou com outro approach, porque na época eu era universitário e tinha um cartão internacional. Então eu comecei a comprar pra mim e pros meus amigos. E eu falei: nossa, tem um potencial grande nesse negócio. Vou começar a prover um tipo de serviço de pagamento local para esse game para o pessoal ter acesso a esses produtos e criar a necessidade no player brasileiro. Mostrar como que era divertido ter a versão premium. Aí, a gente iniciou em 2004 a empresa em Maringá com eu e meu irmão como sócios e, daí em diante, foi só aumentando as parcerias.
GB: E quando vocês passaram a ir em grandes eventos e divulgar o Boa Compra?
CR: A gente começou a ir em 2008, a gente ainda estava começando. No Brasil, ninguém falava disso ainda, mas no mercado europeu já estava bem maduro. A gente começou a participar da Games Convention, um dos primeiros eventos em que trouxemos dezenas de contratos, porque eles falavam: Brasil? Ah, tudo bem, pode pegar.
GB: Eles não tinham perspectiva do mercado nacional [brasileiro]?
CR: Exato. Hoje todo mundo olha para o Brasil, todo mundo quer traduzir o conteúdo para o português, todo mundo quer entrar no mercado brasileiro porque está vendo o dinheiro que existe. Mas, na época, eles falavam: "Brasil? Pode pegar. Pega o jogo e leva para lá, faz o que você quiser".
GB: E, atualmente, vocês estão publicando jogos ou ainda no ramo da venda de créditos?
CR: O Boa Compra, depois que foi adquirido pelo UOL, evoluiu. A aquisição foi feita há dois anos e, a partir daí, a gente entrou [com mais parcerias]. Tem duas marcas novas trabalhando conosco, uma é a Gamérica que é responsável pela área de publicação, e a outra é a Xfire, que vai ser uma plataforma de eSports. Ainda não lançamos ela, mas já foi anunciado pela imprensa que nós licenciamos essa plataforma de eSports para poder organizar esses eventos de... principalmente de moba (Multiplayer Online Battle Arena) hoje, mas [também] de tudo que é jogo para PC, campeonatos online, etc.
Podemos esperar muitas novidades no mundo dos eSports |
GB: E qual o foco da empresa atualmente?
CR: Hoje, o Boa Compra oferece o serviço de pagamento para todo tipo de empresa. No UOL, nós temos um grande grupo de mídia. Então, dentro dele, nós identificamos muitos usuários na área de games. Hoje, nós atingimos, mais ou menos, 1.2 bilhão de pageviews por mês só na parte de games do UOL. E aí, começamos a identificar o que os usuários queriam. Porque não é simplesmente trazer pagamento. A gente identifica o que é que o brasileiro está jogando, o que ele gosta e chegamos então nessas empresas e ofertamos a opção de pagamento local [no Brasil]. Esse é o foco da empresa, a gente sempre trabalhou com isso... com a intenção de sempre ajudar o jogador. A partir daí, começamos a ter as novas aberturas na área de publicação, que é um novo negócio aí, com a Gamérica, e, na área de eSports, agora identificamos que há muita gente apaixonada por jogos, quer se profissionalizar, então tem uma oportunidade boa aí. Os nossos parceiros querem que a gente promova os jogos dessa maneira e não tem porque ficarmos de fora disso não.
GB: Vocês começaram pequeno, certo? Como foi essa transição para uma empresa grande, como o UOL? Houve receio de perder o controle criativo da empresa, perder o poder de decisão ou foi algo natural e que tem sido frutífero?
CR: A empresa cresceu bastante. O nosso timing era muito bom na época. Quando todo mundo olhou para esse mercado, nós já estávamos posicionados. Ou seja, as principais empresas da Europa e aqui dos Estados Unidos já trabalhavam com o Boa Compra. Então, o que foi que a UOL vislumbrou, como chegou a identificar a oportunidade? Quando eles foram entrar nessas empresas que eram conhecidas nossas mas do mercado em geral no Brasil, eles levaram um não. "Não, para quê? Não conheço o UOL" falavam os donos de empresa. "Eu conheço o Boa Compra, estou trabalhando muito bem [com eles] e gerando um resultado bom para nós.". E o pessoal [da UOL] "mas, pô, quem são eles? Esse Boa Compra? Um cara de Maringá, como assim?"
GB: Perdido ali no interior do Brasil (risos).
CR: Exato (risos)! E foi aí que teve esta oportunidade. Eles entraram em contato conosco e pediram para entender melhor o trabalho que estávamos fazendo. Eles achavam até que tinha alguma ligação com o PagSeguro e eles viram que não, que é um modelo de negócios totalmente diferente. É um mercado de nicho mesmo, focado para empresas de games. Então, eles viram que era uma oportunidade boa e ficaram impressionados com o potencial criativo também. O fato de ser uma empresa nova e inovadora. E eles falaram: "Olha, empresas de pagamento existem 10 iguais a de vocês, mas o que a gente quer é que mantenham isso que já existe na empresa porque é isto que está trazendo sucesso". Então, a condição do negócio foi justamente manter eu e meu irmão na diretoria da empresa e seguir crescendo e inovando da mesma maneira.
GB: E a sede continua em Maringá ainda ou mudou para o eixo Rio-São Paulo?
CR: A gente tem alguns funcionários em São Paulo agora, mas a sede principal continua em Maringá.
GB: Isso é muito bom, pois dá para ver que, mesmo em uma cidade "pequena" é possível ter uma empresa de sucesso que pode ser adquirida por uma multinacional.
CR: Sim! Eu acho que, depois da Internet, não existem mais limites de fronteira, né?.
GB: E quantas empresas vocês têm parceiras? Quantos jogos atualmente vocês já servem?
CR: Hoje, são mais de 100 empresas que trabalham com o Boa Compra e mais de 3.000 títulos que possuem pagamento local. Em dezembro do ano passado, fechamos a principal parceira que foi com a Valve, dona do Steam. Isso trouxe um sucesso estrondoso para a empresa. Também fechamos com exclusividade o League of Legends, que só o Boa Compra faz no Brasil. Então, são títulos importantes. E estou falando de 3.000 títulos aproximados, pois dentro da Valve tem vários, que é um outro modelo de negócios.
Parceria com o Steam alavanca vendas no Brasil |
GB: Então, vocês com a plataforma Xfire e com essas parcerias, podemos esperar algo relacionado a League of Legends, Dota 2 com eSports?
CR: Com certeza! A gente vai trazer muito evento novo para o Brasil. Ano passado, nós já realizamos aí em parceria com a SL, as finais nacionais e continentais de Starcraft 2 para Blizzard. Então, a gente já fez a final nacional de SC2 no Rio de Janeiro e a continental em São Paulo. Então, foram dois grandes eventos que nós já administramos no passado. Isso sem a plataforma licenciada. Agora, com a plataforma licenciada, esperamos trazer muita coisa nova.
GB: E a Blizzard? Chegaram a ter alguma parceria com ela também?
CR: Na semana passada... faz poucos dias, que fechamos uma parceria exclusiva com a Blizzard para World of Warcraft. Hoje, eles oferecem a opção de pagamentos em reais, mas utilizam uma plataforma estrangeira para coletar os pagamentos. E, então, nós acabamos de fechar um acordo para comercializar World of Warcraft [no Brasil].
GB: Bacana isso.
CR: Está começando agora com World of Wacraft, mas, com certeza, vão ver o potencial, porque aumenta muito [o volume de vendas], é muito diferente, né? Nós que somos brasileiros entendemos. Não adianta ter lá a opção de cartão de crédito, pois como o garoto que joga vai explicar? "Vou pedir ao meu pai o cartão dele". Aí, no site de um jogo, você acha que [o pai] vai colocar? Não vai. Isso que estamos [tentando] mostrar para a Blizzard, que [o mercado] é diferente no Brasil. Estamos agora com WoW e eu espero que parceria vá crescer no mesmo nível que cresceu com as outras empresas. Nós começamos, na semana, a opção de compra por SMS, um negócio inovador com a Blizzard. A gente deu essa sugestão para aumentar as vendas.
Mais uma parceria de sucesso! |
GB: Isso foi muito divulgado? Por que não lembro desses anúncios...
CR: Acabou de ser anunciado. Até a nossa assessoria [de imprensa] nos alertou que iríamos lançar essa promoção mas ninguém na E3 saberia por estarem aqui. Mas, muita gente que está dentro dos canais de comunicação do Boa Compra está por dentro dessa novidade. É um novo modelo de negócios que estamos colocando na parte de pagamentos, incentivando o SMS. Acho que é fácil para qualquer um.
GB: E no caso dos consoles, é mais difícil?
CR: Dos consoles é ainda muito difícil. O mais complexo aí é a integração. Mas é algo que estamos negociando constantemente. O mercado brasileiro, apesar de ter crescido bastante, eles [fabricantes de consoles] acreditam que os pagamentos locais não vão agregar muito ao negócio. Mas, com certeza, é algo que estamos de olho. Queremos facilitar a vida dos usuários, pois muita gente não compra, não utiliza a plataforma.
GB: E com a plataforma Xfire, vocês planejam suportar outros jogos, como Fifa, NBA2K, etc. para os eSports? Algo planejado?
CR: A gente que entrar nesses jogos também, mas, por enquanto, não posso divulgar quem são os parceiros com os quais estamos negociando. A gente quer entrar mesmo nessa área de eSports, como futebol, basquete e shooters também, como CrossFire, Counter Strike. Vai ter para todos os gostos. Até em novos lançamentos, que já estão sendo criados voltados para eSport.
Christian Ribeiro |
CR: Começou com as próprias barreiras que o país impõe. O meu pai foi um dos principais investidores no negócio, até porque nós não tivemos outra alternativa. Eu me lembro até hoje, ele financiou o carro para me dar o dinheiro e montar a empresa, pois ele estava tão seguro que daria certo. Ele financiou o único bem que ele tinha naquele momento para a gente iniciar a empresa. E a gente até consultou alguns órgãos do governo para ver como funcionar e a resposta que tínhamos era para não fazer isso, porque teríamos problemas. "Não continua, deixa isso para lá". Mas, a gente acreditou naquilo, sendo bem difícil no começo.
GB: E a barreira com o usuário?
CR: Essa já foi até mais simples de quebrar. O que fizemos foi justamente mostrar o contrário. Você não precisa se satisfazer só com a versão gratuita, você pode ter a versão premium e se divertir muito mais. Ou seja, não era uma questão de condição financeira, pois falavam que "Brasil" não compra por ser país de terceiro mundo. Não, não era isso. As pessoas [empresas estrangeiras] não estavam tentando como funcionava [no Brasil]. O recurso até existia, mas não era divulgado, pois as empresas não se preocupavam com o país. Acabou que ficou sem suporte para o usuário brasileiro. Quando a gente começou a dar esse suporte, aí sim percebemos que o público brasileiro gosta sim da coisa boa e quer se divertir como todo mundo.
GB: E quando tem essas disparadas do dólar? É muito complicado lidar com esse câmbio flutuante e nuances da economia brasileira?
CR: Hoje, a maioria dos parceiros precifica os produtos em reais, algo que exigimos deles. Então, muitos games que vêm ao Brasil acabam chegando com preço diferenciado. Porque não adianta trazer um produto que custa 12 euros na Alemanha a 30 reais no Brasil porque ele não venderia. A gente tem essa "indicação" [aos parceiros], todo um estudo do mercado sobre o produto que está entrando para trazer isso nas condições que o brasileiro consegue consumir. Não adianta trazer um jogo e vender a 200 reais, que é o que acontece com os revendedores hoje. Nós queremos trazer os jogos por 15 reais, 10 reais. Ou seja, trazer nas condições que a Valve trouxe. Em vez de comprar um jogo pirata, você pode comprar jogar originais pelo mesmo preço. Então, acho que isso é algo que a Internet está trazendo.
GB: E as publishers então estão cientes que receberão um percentual menor do que estão acostumadas?
CR: Sim. É questão de adequar o produto para as regiões. Eles verificaram que isso não é só no Brasil que acontece, mas também em outros países emergentes em que as publishers trabalham com preço diferente. Não é questão de lucrar mais ou menos, mas sim oportunidade de abrir um novo mercado. De onde você está ganhando nada, é melhor ganhar 10 do que nada. E é sempre o que o Boa Compra tenta explicar aos nossos parceiros internacionais. A gente dá as condições, mostra como funciona, o país é grande. A expansão da banda larga felizmente já começou, acho que hoje tem 40% da população coberta, sendo 60% oportunidade crescer. Então, se os números estão bons agora, vai melhorar ainda mais.
GB: Vocês também possuem sede em Portugal, correto? Vocês trabalham no mercado de lá?
CR: Nós temos um escritório em Lisboa e um dos motivos para isso foi que, como Portugal é um país pequeno, cerca de 10 milhões de habitantes, não tem o mesmo poder que o Brasil quando você vai negociar com as publishers. E como estávamos localizando muitos jogos para o Brasil, trazendo para o mercado brasileiro, os usuários portugueses começaram a frequentar os nossos sites. E um usuário de lá me mandou um email relatando que não tinha como comprar lá. E pensei que era a chance de abrir lá também. Então tivemos essa ideia, que estava atingindo esse público. Como é um mercado menor, já incluo nas negociações. Tanto Portugal, como América Latina, onde estamos localizando alguns jogos para o espanhol. Com esse crescimento, esperamos entrar na Espanha também em breve.
GB: Quais jogos vocês já chegaram a localizar?
CR: Dentre alguns, chegamos a localizar o Magic Campus, Eredan... Falando assim de cabeça, são os que me lembro.
GB: E qual a sensação de chegar onde chegou? O que você falaria para essa garotada que quer trabalhar com jogos?
CR: Falta muito o pessoal querer acreditar no que está fazendo. Perde a esperança muito rápido. Se você identifica como oportunidade de negócio, investe naquilo. Não vai pelo que as pessoas tão falando. Sempre vai ter gente que vai falar que não dá certo, que você vai ficar pobre e perder tudo. Se você acredita, acho importante seguir em frente. Hoje mais do que antes, que temos pessoas dispostas a investir pesado em ideias. Quem está na faculdade tem mais que botar o projeto pra frente e ver acontecer. Ainda mais [trabalhando] em um estágio.
Elizabeth Mariam Goodno, Gerente de Comunicação, à esquerda e Christian Ribeiro, CEO do Boa Compra, à direita |
GB: E parcerias com desenvolvedores nacionais?
CR: Eu gostaria de fechar parcerias, mas é muito difícil. Os produtos desenvolvidos ainda são muito aquém do que a comunidade espera. Mas, com certeza, tendo um projeto legal, estamos até dispostos a investir nesses projetos e ajudar a realizar os sonhos dessas pessoas que querem entrar nesse mercado.
GB: E pensam em fazer jogos?
CR: Não... isso já é um pouco mais complicado, foge do nosso foco. No Brasil é um pouco complicado. Talvez com parcerias, talvez a gente conseguisse fazer algo. Não é nosso foco atualmente.
GB: E questão de trazer merchandising, como bonecos e livros baseados em jogos, pensam nisso?
CR: No momento, não. Mas, se as empresas tiverem interesse em fechar parceria com o Boa Compra, com certeza. Não tem um limite para nós. É um pouco mais complicado, porque não há distribuição no Brasil. Seria preciso importar e, se você importa, fica um preço absurdo. No mais tardar, próximo ano talvez tenhamos algo a anunciar.
GB: E daqui para frente, o que você imagina? Daqui a quatro, cinco anos? Como você planeja expandir ainda mais o Boa Compra?
CR: O que queremos fazer é, justamente, trazer em tempo real o que acontece no mundo para o público brasileiro. Com a parceria com o UOL, isso está se tornando cada vez mais real. O que é quero é que lançou um beta fechado aqui nos Estados Unidos, que também seja mostrado para o público brasileiro. Vamos trazer em tempo real. Lançamento aqui, lançamento lá. Trazer esses produtos top one para o mercado com grande estilo, do jeito que o público merece.
GB: Muito obrigado pela entrevista e boa sorte nos próximos desafios!
Revisão: Bruna Lima
Capa: Daniel Machado