Por que o anúncio do novo Xbox deixou um gosto amargo

em 21/05/2013

A oitava geração de consoles começou com uma certa melancolia. A estreia do 3DS foi fraca, embora o portátil já tenha se recuperado. O Vit... (por Bruno Grisci em 21/05/2013, via GameBlast)

A oitava geração de consoles começou com uma certa melancolia. A estreia do 3DS foi fraca, embora o portátil já tenha se recuperado. O Vita por enquanto não tem tido a mesma sorte, o Wii U se envolveu em vários problemas, sendo o mais recente e mais barulhento a ruptura da Nintendo com a EA, e a apresentação do novo PlayStation poderia ter sido mais entusiasmada. Mesmo assim, hoje era um daqueles grandes dias na indústria dos jogos: anúncio de console novo, todos os olhares voltados para o evento da Microsoft que revelaria a próxima geração de Xbox. Depois da Nintendo e da Sony mostrarem suas apostas, o que a “novata” teria reservado para o mundo dos games? Bom, de fato nos mostraram o Xbox One, com direito a visão por todos os lados do aparelho, ao contrário do PS4 que está escondido até agora. Só faltaram os jogos.
Como assim, Bruno, não mostraram jogos suficientes no evento?
Mostraram, tivemos os anúncios de Forza Motorsport 5 e Quantum Break, que, tudo indica, serão ótimos títulos. Tivemos Andrew Wilson da EA Sports no palco mostrando todos aqueles jogos esportivos que você poderá jogar em qualquer lugar, a não ser que seja um fã da Nintendo (ou não). Tivemos até o anúncio de que o modo Ultimate Team do FIFA 14 será exclusivo (pelo menos por enquanto) do Xbox One e um novo Call of Duty com cachorros. Os jogos estavam lá e a Microsoft disse que virão mais na E3 e no futuro próximo. E eles virão. “Temos mais novas franquias sendo produzidas agora do que em toda a história do Xbox”, como foi informado. O retorno de uma franquia clássica da Rare foi prometido. Mas podiam ter mostrado um único jogo hoje, podiam ter mostrado a biblioteca de uma geração inteira, não é esse o ponto. A questão é o foco da apresentação e a direção que o Xbox One seguirá.
Mas a Microsoft já havida dito que o evento hoje era apenas sobre o aparelho e os jogos seriam mostrados na E3.
É aí que está, a revelação de um novo console onde os jogos não são o principal. Tudo bem, é interessante vermos as especificações técnicas, ver o que o aparelho tem a oferecer a mais. Acontece que a estrela do show foi esse “a mais”, enquanto os jogos apareceram como um extra. É normal que a Apple, a Samsung ou o Facebook, que não são desenvolvedoras de games, os tratem como um dos aplicativos dentre os demais milhões de usos de suas plataformas. Algumas pessoas veem essa situação como uma ameaça ao segmento especializado, mas a verdade é que essas abordagens não são exclusivas, elas apenas agregam um novo formato. Agora, quando a postura de não priorizar os jogos parte de uma empresa e de um produto que supostamente tem essa como sua razão de existência, a situação é muito mais delicada.

Baseado no que vi na apresentação, me parece que o propósito do Xbox One não é ser um console de videogames, é ser uma central multimídia na sua sala. Ok, nada contra os aparelhos oferecerem mais possibilidades, desde que começaram a permitir a visualização de filmes esse era um caminho natural. Tanto o PS4 quanto o Wii U oferecem esses bônus, o console da Nintendo até mesmo conta com o TVii, um sistema para assistir a programas de televisão, filmes, partidas esportivas, etc. Mas nestes consoles este outro lado está sempre voltado de certa forma aos jogos ou como um pequeno bônus. As opções de interação social do MiiVerse ou a possibilidade de compartilhar vídeos de streaming de seções de games, por exemplo, estão a serviço dos jogadores.


A Microsoft revelou um novo Kinect, seu “controle sem controle”, uma ideia com muito potencial para jogabilidades originais. Ele será muito mais preciso, com uma câmera 1080p com alcance 60% maior e possibilidade de captura de 60 quadros por segundo. Não sabemos como será usado em jogos, contudo, já que a sua demonstração era uma conversa no Skype e a possibilidade de trocar aplicativos via comando de voz.

Lembram que a EA Sports subiu no palco? Comentaram Madden 25, novo jogo de futebol americano. Mas isso é detalhe, o foco mesmo era contar que a parceria com a NFL (a principal liga de futebol americano dos EUA) permitiria maior acesso às partidas via Xbox One. Não tivemos um novo Halo ou Gears of War como alguns apostaram, mas tivemos Steven Spielberg anunciando o desenvolvimento de uma série de Halo.



O Xbox One é uma TV inteligente. Um aparelho que você liga na televisão e permite assistir a filmes (em Blu-ray), acessar a internet, conversar com os amigos, ver vídeos e fotos, acompanhar partidas esportivas e até mesmo jogar algo. Sim, você pode fazer essas coisas em outros consoles, mas eles são aparelhos para videogames que tem recursos multimídia. O Xbox One é um aparelho multimídia com suporte a videogames, que inclusive implementa multitasking para você poder usar tudo isso ao mesmo tempo, rodando com o suporte do Windows 8 em uma versão específica.

A Microsoft foi muito inteligente em seu plano para dominar a última tela disponível depois das de celulares, tablets e monitores de computador: a sua televisão. As tentativas de controlá-la não foram poucas, mas a estratégia de Samsungs e LGs de adicionar aos poucos mais recursos aos televisores não garantia um domínio ao estilo iPhone e Android nos celulares. A própria Apple tentou com a Apple TV, mas não vingou. A Microsoft foi mais esperta: em vez de “atacar” a tela, venda o que as pessoas conectam a ela. No começo da década, o que as pessoas ligavam nas TVs eram consoles, então um console foi. Uma década mais tarde este aparelho pôde ser transformado numa central de entretenimento, com interação, é claro, com smartphones e tablets, que podem ser utilizados como controle. Uma vez conectado, o consumidor tem tudo que necessita num único aparelho, não precisa dividir atenção com os outros serviços que disputam o espaço da sala. Jogar não é o foco, não querendo nem precisa-se de um controle específico.

Tudo bem, isso parece mesmo muito dramático de minha parte. Resmungos de um jogador. Que mal há em todos esses recursos extras? Os jogos continuam existindo de qualquer jeito. É verdade, e enquanto tivermos todas as opções a situação está ótima. O problema surge quando vislumbra-se a possibilidade deste tornar-se o modus operandi de toda a indústria, no qual os jogos possuem menos destaque, menos relevância. Sempre joguei muito em computadores, que são máquinas multitarefa. Há muitos games ótimos para celulares. Mas não há como negar a importância da existência de aparelhos que dediquem-se aos jogos como função primária.

A filosofia da Microsoft sempre foi um caso à parte, enquanto a Nintendo e a Sony oferecem seus consoles mas também desenvolvem pesadamente para eles, a marca principal da norte-americana é o próprio Xbox. Uma vez li em um artigo que a Nintendo poderia se dar ao luxo de comprometer um de seus aparelhos, pois se suas séries estivessem saudáveis um novo hardware poderia se recuperar. Já se as franquias começassem a perder qualidade e público, a situação seria irreversível.  A Microsoft parece adotar o processo inverso, até mesmo porque a maioria dos games provém de terceiros. Seus estúdios internos em geral foram adquiridos em negócios e, nos casos da Ensemble Studios e da Rare, algumas boas franquias acabaram morrendo no processo.

Uma das “três grandes” first-party anunciou seu novo console hoje. Mas os jogos, por enquanto, ficaram assistindo da plateia. E isso é difícil de engolir.

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