E quando o fim é, na verdade, o começo? Discutindo o conteúdo adicional em jogos

em 07/05/2013

É quase uma ofensa para alguns jogadores assistir speedruns no YouTube onde aquele jogo que demoraram meses para finalizar é concluído em... (por Unknown em 07/05/2013, via GameBlast)

É quase uma ofensa para alguns jogadores assistir speedruns no YouTube onde aquele jogo que demoraram meses para finalizar é concluído em questão de minutos. Super Mario 64 em cerca de quinze minutos, ou The Legend of Zelda: Ocarina of Time em menos de duas horas. Ao mesmo tempo, muitos consumidores sentem-se receosos ao adquirir um game no caso de terem o visto ser finalizado em poucas horas. É evidente que o tempo de jogo faz o consumidor pensar se vale o investimento naquele título. Por essa razão as produtoras tentam esticar o tempo da aventura de diversas maneiras: em alguns casos muito justas, mas em outros, uma completa vergonha. E é sobre isso que discutiremos hoje.


Tamanho não é documento?

Durante pouco menos de uma hora é possível finalizar vários jogos do NES, como o tão popular The Legend of Zelda. Talvez vocês não façam isso na primeira experiência com o game, mas depois de algumas tentativas é fácil decorar os caminhos e não perder tanto tempo para finalizá-lo. Wario World e Medal of Honor: Vanguard levam pouco menos de seis horas até mesmo para uma primeira experiência nesses jogos. Um game pequeno não é problema; ele só precisa animar você a jogar novamente. Em Pikmin e Luigi's Mansion (ambos do Nintendo Game Cube), infelizmente, esse incentivo é fraco. É verdade que ao finalizar Luigi's Mansion você tem acesso ao cenário mais difícil e com algumas diferenças, mas convenhamos que não é o meio mais criativo de convidar o jogador a saborear aquela aventura mais uma vez. Eu não sou fã de FPS, mas quando joguei Call of Duty: World at War pela primeira vez lembro-me de ter finalizado em aproximadamente cinco horas com o único objetivo de abrir o modo Nazi Zombies que meus amigos gostavam tanto. Nunca mais voltei para a história e não conheço alguém que tenha procurado repetir a experiência de algum CoD.

Jogos com menos de seis horas de duração são bem comuns hoje em dia. Entretanto você não vê nenhum produto usando isso como uma qualidade, ou escrito na caixa do jogo "seis horas de entretenimento", pelo contrário, isso é visto como desvantagem. Mas seria justo avaliar um livro apenas por ele ter cerca de 100 páginas? Portal, da Valve, é um excelente exemplo. O game tem pouco menos de seis horas para concluir a história, mas foi possível ver a legião de fãs que ergueu na época de seu lançamento e pessoas repetindo a jogatina para conseguir resolver os puzzles no menor tempo possível e melhorar suas habilidades.

Você não está jogando


Buscando prender o consumidor na frente da TV por mais tempo e transmitir a satisfação de que seu dinheiro foi bem investido, temos títulos pequenos vestidos como grandes. Resident Evil 2 pode ser finalizado em pouco tempo por um jogador mais experiente, mas geralmente são os fãs da franquia que ocupam essa posição, pois quem conheceu o game e não gostou muito, dificilmente ficará motivado a rodar uma delegacia procurando chaves e outros itens. Geograficamente, o espaço onde a trama acontece é pequeno, mas Capcom coloca você na ilusão chamada backtracking em que é preciso, frequentemente, voltar até um lugar anterior para abrir uma porta ou pegar um objeto. Nesse tempo indo de um ponto ao outro para cumprir uma simples tarefa, você não pode falar que está jogando, ainda mais quando não há inimigos no caminho. É como pedir para seu irmão ir buscar algo na cozinha enquanto você esconde alguma coisa na sala sem ele saber: é necessário tempo para isso, e a produtora precisa que você olhe no relógio e sinta que jogou muito.

Caso você seja homem e tenha uma namorada sem muita afinidade com jogos, deve imaginar que ela dificilmente pensará em comprar um Resident Evil 6 para curtir sozinha (a menos que você seja muito fã da franquia e exerça forte influência sobre ela). Isso seguindo o estereótipo da menina que só gosta de Just Dance em festas e "o jogo do Mario" (ela tem Mario 3D Land no 3DS, por exemplo). The Legend of Zelda também não atrai esse público. São games que vendem bastante, mas sobrevivem mais por seus consumidores já fidelizados. E vejam: um novo jogador de Resident Evil e The Legend of Zelda, geralmente conhece essas franquias pela referência e influência de algum amigo próximo.


Então, o que motiva o público do mercado de jogos eletrônicos, a se aventurar pela segunda vez? Um jogo no Brasil é mais caro que um livro, cd ou filme, e ao contrário desses produtos, o entretenimento proporcionado pelo game pode ser muito limitado. Chrono Trigger gerou essa motivação através de finais diferentes. Você já jogou esse título e conseguiu ver todos os finais? É uma tarefa difícil, ainda mais com o acréscimo de novas conclusões cada vez que ele é relançado. Em Eternal Darkness você precisa finalizar o jogo pelo menos três vezes para assistir a verdadeira conclusão da história, mas o que pode parecer cansativo e repetitivo, não é, pois uma simples escolha no começo muda completamente o desenrolar da trama. Rotas alternativas em games de plataforma, como o próprio Mario, podem ser uma solução. Resident Evil 4 faz isso muito bem, já que ao terminar você abre um caminho alternativo jogando com uma nova personagem: é o mesmo título, mesmo cenário, visto por outro ângulo, completando a história do game e esclarecendo algumas dúvidas. Ainda dentro de Resident Evil, temos armas acessíveis desde o início em uma segunda partida.

Você, eu e o mundo


Em minha opinião, cerca de vinte horas de jogo de Chrono Trigger, estão de bom tamanho. E não digo que algo com menos de seis horas seja ruim, pois Portal é um de meus jogos favoritos. No caso de Chrono Trigger isso poderia ser pouco, assim como vinte horas de Portal (o primeiro) parece muito. Como agradar um público dividido entre aqueles que desejam suas 70 horas de jogo em Final Fantasy e ao mesmo tempo satisfazer os que não aguentam esperar mais de seis horas para finalizar uma história? Pokémon já ensinava sobre isso em meados dos anos 90. Para finalizar a aventura principal, o jogador não leva muito mais que dez horas; mas se quiser enfrentar todos os treinadores, elevar o nível de seus monstrinhos e mesmo buscar uma harmonia na equipe, pode chegar até vinte horas de game. Muitos podem parar aqui ou recomeçar com monstrinhos diferentes. Ao mesmo tempo, há uma fatia do público interessada em conferir o que acontece quando a aventura termina: subir seus monstrinhos até o nível máximo, elaborar uma estratégia e montar equipes para enfrentar outros treinadores. Esse é um processo que pode render anos. Mario Kart não está muito longe disso: mesmo lançado em 2005, Mario Kart DS foi adorado pelo público até a chegada de Mario Kart 7 em 2011.

A atividade entre múltiplos jogadores era limitada como um evento local para duas a quatro pessoas até alguns anos atrás. Atualmente a tecnologia permite interagirmos com milhares ao mesmo tempo em MMORPGs. O multiplayer online é usado como um truque para prolongar as horas de jogatina. Isso pode durar anos, no caso de Mario Kart, Pokémon e até Counter Strike, ou apenas alguns meses como na maioria dos games de console. Não é um NPC bloqueando o caminho que faz você ir atrás de algum item e ficar mais tempo naquele jogo, mas sim a experiência coletiva. Infelizmente, mesmo com todos empolgados no game, a falha estrutura do modo multiplayer não compensa a espera para ter diversão. Em MMORPGs, o cenário é pequeno, vocês podem andar pela mesma cidade muitas vezes, matar os mesmos monstros, mas o progresso compensa com os pontos de experiência e evolução do personagem. O problema é quando isso não é acontece devido ao lag (lentidão) e quedas de conexão com o servidor. Então, temos a ilusão de que um modo online (pós-jogo ou ao longo do mesmo) prolongará a experiência com o produto e nossas esperanças são destruídas pela estrutura debilitada da modalidade do game.

Continue a jogar, por favor


Já percebemos que o consumidor precisa de uma motivação para continuar jogando e ter a sensação de que valeu a pena adquirir o game. Nesse ponto, a técnica mais simples é trabalhar com o ego humano. Pessoas gostam de elogios, sentirem-se úteis ou importantes. Para elevar a autoestima do jogador, temos os achievements. Eles vão desde "parabéns por ter concluído a aventura" até "parabéns por ter dado um passo". Honestamente, eu me senti um idiota quando destravei o achievement em Cave Story após pegar a pistola. Não me entendam mal, caros leitores, mas encontrar uma pistola em um game de plataforma onde você elimina os inimigos dessa maneira parece básico demais para ter mérito e acredito que alguns de vocês pensem da mesma forma.

Aqui, de uma maneira mais simples, está o sucesso do MMORPG. Você elimina o inimigo e aumenta a pontuação imediatamente. Cada combate dura alguns segundos, mesmo em níveis menores. Com pouco tempo você eleva o nível, recebe pontos em seus atributos e aprimora o equipamento. Logo mais adiante, pode avançar de classe. E assim, aos poucos, é recompensado por ter avançado em um nível. Junte nisso o multiplayer online, já que você está interagindo com milhares de pessoas e investirá algum tempo apenas conversando com elas ou buscando objetos em lojas gerenciadas por outros jogadores. Unindo todos esses elementos, entendemos a razão desse tipo de game ser tão viciante.

O sistema de recompensa aparece mesmo nos jogos mais antigos, sem modo online, como a franquia Sonic onde a exploração do cenário garante vidas extras. No caso de Yoshi's Island, a exploração é recompensada com acesso a fases especiais . Itens colecionáveis também estimulam o jogador a tentar zerar a aventura outra vez, mesmo que não tragam vantagem alguma na história. Aí temos novamente a estratégia do ego. Com os achievements você pode mostrar para todos os amigos que encontrou aquele objeto secreto, terminou a coleção de itens, completou o desafio, dentre outras situações. Temos redes sociais apenas sobre games e podemos divulgar esses "progressos" diretamente em nossos perfis virtuais para exibir ao mundo o que o homem ama dizer desde que aprendeu a se comunicar: "eu sou melhor que você". Isso é motivo suficiente para investir mais algumas horas naquele jogo. 

Só um trocadinho não fará falta


E como conteúdo não é o bastante, temos atualizações disponibilizadas pouco depois do lançamento do game indo desde um uniforme novo para o seu personagem lutar até novos cenários e modalidades. Particularmente, vejo DLC como um meio de conseguir mais dinheiro além do lucro na mídia física. Se é bom e necessário ou não, é uma questão muito relativa. Há quem veja como tolice a nova cor para roupa de um personagem em Street Fighter, enquanto alguns sentem toda a diferença nisso. Isso varia com a experiência de cada jogador, o que ele já testou e seus gostos pessoais. Grand Theft Auto é um título que, por menos que joguem sua história, venderia bem DLCs com novos tanques de guerra ou formas de destruir a cidade.


Há quem prefira lançar aventuras em episódios, como acontece em Sonic atualmente. Quem fez isso bem foi a Valve com Half-Life 2. O game sozinho já encerra a história e pode deixar o jogador confortável em sua conclusão. O primeiro episódio começa pelo fim da trama e encaixa perfeitamente; o mesmo acontece com o segundo (e não vamos discutir o lançamento de um terceiro, por favor). Eles adicionam conteúdo à história e não são grandes como um novo, fazendo bem o papel de complemento. Essas atualizações também podem salvar uma má recepção, como aconteceu em Mass Effect 3.
Avaliar um jogo pelo seu tempo médio para ser concluído é tão injusto quanto julgar um livro pela quantidade de páginas. Da mesma forma, me parece errado cobrar pela continuação da história de um game que você já comprou. Há muitos títulos que conseguem incentivar o jogador a tentar mais uma vez, mas não é uma tarefa tão simples que possa ser realizada em qualquer game. Várias produtoras ainda não aprenderam como fazer isso. Agora diga: o que um título deve ter para motivar você a jogar outra vez ou investir mais algumas horas? O que te anima a ligar o videogame com um game que você tem há muito tempo e já terminou o principal?

Revisão: Bruna Lima
Capa: Douglas Fernandes


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