A quantificação do valor de um jogo em um número: o peso das notas em análises de jogos

em 22/04/2013

Oito! Pronto. Esse texto tem um oito ali embaixo. Logo, você pode concluir que ele é bom e não precisa mais ler, pode fechar a aba de seu... (por Unknown em 22/04/2013, via GameBlast)


Oito! Pronto. Esse texto tem um oito ali embaixo. Logo, você pode concluir que ele é bom e não precisa mais ler, pode fechar a aba de seu navegador. Pode parecer brincadeira ou exagero, mas é exatamente assim que funciona muitas vezes. Leitores correm em sites e revistas apenas buscando por aquele número e ignorando todo o conteúdo restante que valida a razão da existência daquele número para aquele jogo. E você? Já leu uma análise para entender a razão daquela nota? Já tentou descobrir, antes de julgar, a razão daquela nota estar abaixo do que você esperava ou muito acima? Hoje vamos aprender o que é uma nota, sua função e importância, tal como o compromisso do juiz que anexa aquela nota ao jogo e como isso é feito ou deve ser feito.

Começando pelo início


Analisar é decompor um tema em diversos tópicos para obter uma compreensão melhor deste. Por um caminho mais técnico, uma análise pode ser feita avaliando atributos que conotem "qualidade" ao tema em questão. Para nós, nesse caso, jogos eletrônicos. Para os saudosistas da década de 90, lembram muito bem das publicações que cabeçaram o jornalismo de games no Brasil e como a nota final era uma média de outros critérios. Por exemplo, "gráficos" era um desses critérios e tinha como função avaliar a qualidade gráfica do jogo, se usou bem o potencial do console naquele jogo ou até mesmo se estava próximo do que outros jogos daquela geração ofereciam. De certo modo, é realmente possível avaliar a qualidade gráfica de um jogo de forma mais técnica, mas acreditem, não é tão simples para ser feito apenas "olhando". Outro critério curioso era a jogabilidade (gameplay) que, apesar do neologismo, servia para quantificar o sucesso que aquele redator teve em sua curva de aprendizado para dominar os comandos. "Diversão" é o critério mais confuso, pois é evidente que não é um conceito técnico e está diretamente ligado à experiência pessoal. Entraremos nesse ponto mais adiante.

Em meio a esse jornalismo informal e imaturo, vestindo uma roupa de técnico e profissional, temos os consumidores que buscam aquele conteúdo por alguma razão. E essa razão é bem pessoal. A função de uma análise varia de leitor para leitor. Em alguns casos, o leitor busca uma análise do jogo apenas para ter uma opinião melhor sobre o jogo antes de comprá-lo. Em outro caso, ele pode estar apenas buscando expandir seu conhecimento e formar uma opinião (por mais simples que seja) sobre aquele jogo. Independente da sua razão, se você busca uma análise, você busca no mínimo conhecer os prós e contras daquele jogo.

A perfeição é, em sua essência, imperfeita


Recentemente foi anunciado no Nintendo Direct, um novo game da franquia The Legend of Zelda que deve ser lançado no Natal desse ano. Mesmo quase um ano antes do lançamento do jogo e tendo apenas um curto vídeo com alguns exemplos de como o jogo será, eu posso afirmar com plena certeza que esse jogo não terá uma nota muito abaixo de 8/10 (isso é, se conseguir menos que 8 em algum lugar!). Pode parecer arrogância ou prepotência, mas você que joga videogame há anos e acompanhou a história da franquia, sabe que Zelda é... Zelda. A franquia já estabeleceu um alicerce tão firme em nossa cultura que chega a parecer uma ofensa um jogo dessa franquia levar nota baixa por pior que ele seja. A questão é: ele merece mesmo?

Franquias de renome no mercado não precisam de uma campanha de marketing tão forte, pois os fãs já fazem sua publicidade não apenas divulgando, mas aumentando o interesse de novatos com seus blogs e enciclopédias digitais. Consequentemente, eles vendem bem e até ganham prêmios de "jogo do ano". Nos últimos anos, o movimento indie tem ganhado força, mas Daisuke Amaya já havia lançado um jogo produzido apenas por ele em 2004. Hoje, devido a outros fatores culturais, indie é o novo "cool" e esses jogos tem ganho um destaque incrível, chegando a ganhar muitos prêmios. Mas não podemos nos enganar: Supergiant Games, por exemplo, pode ter toda a fama de ser um estúdio indie (e é!), mas é basicamente formado por veteranos do mercado. Então, nem sempre indie significa inexperiente. Então, já podemos entender que a popularidade de um jogo é levada em conta ao avaliar um? Há quem possa dizer que viu um fulano, em um site aleatório, que deu nota muito baixa para algum jogo da franquia de Link, mas esteja certo que essa é uma tática antiga apenas para chamar atenção e ganhar mais visibilidade pro site, pois fãs de videogame (principalmente da Nintendo) costumam defender com unhas e dentes suas franquias favoritas e até divulgar para outros amigos esse "absurdo" como se estivessem chamando reforços para uma guerra.


Apesar da popularidade de um jogo, outra maneira incorreta de avaliar jogos eletrônicos é coloca-los no mesmo lugar que um jogo de outro contexto. Por exemplo, comparar a nota de um simulador de corrida com um Action RPG. Então, se o simulador de corrida conseguiu nota 9/10 e o Action RPG pegou 7/10, logo, o simulador é melhor? Talvez sim. Talvez não. O que responderá isso é exatamente o conteúdo do texto. Essa nota, esse número, deve ser dado dentro do contexto de cada jogo. Logo, é injusto comparar God of War com Harvest Moon por causa de suas notas. São públicos diferentes, ideias diferentes e consequentemente devem ser julgados de formas diferentes, mas ainda assim há quem leve sites agregadores de notas (como o Metacritic) tão a sério e julgando que um jogo é melhor que outro por causa da nota. Por essa razão, um jogo deve ser avaliado por alguém que já tenha experiência naquele gênero: não faz sentido alguém que jogou apenas FIFA e God of War ir avaliar Journey. Não que um jogador desses tipos de títulos esteja incapacitado de julgar Journey, mas seu contexto cultural, gostos e preferências, estão muito distantes e o jogo seria melhor degustado por alguém com maior afinidade com o gênero. Por exemplo, temos Nintendogs recebendo 40/40 na Famitsu e a revolta de muitas pessoas por essa ter sido a nota de The Legend of Zelda: Ocarina of Time anos antes e fizeram comparações como "então Nintendogs é do nível de Zelda?" e posso responder à vocês: não. Entretanto, Nintendogs cumpre bem sua proposta, tal como Zelda fez dentro de seu gênero anos antes.

E precisamos dar uma forma à essa avaliação. Fazemos isso por uma escalada de notas de 0 à 10, de 0 à 5, por estrelas ou qualquer artificio semelhante. Como já dito anteriormente, o leitor corre direto para essa forma antes de ler o argumento do avaliador. Essa realidade torna-se mais palpável em "TOP 10", prêmios ou qualquer concurso que compare jogos diretamente. Em casos extremos temos pessoas discordando daquela nota sem nem mesmo ter jogado o jogo, muitas vezes com base na fama que o jogo tem ou em sua expectativa como jogador. Ah, a expectativa... esse é outro ponto muito relevante.

Nosso mundo e o mundo real


O jogador, o leitor, o consumidor do jornalismo de games deve entender que "o seu mundo" (o ideal) é diferente, e muito, do real. E quando digo isso, me refiro à mim também, pois eu, assim como todos vocês, também sou um jogador e leio análises nos mais diversos sites por aí. Provável que eu já tenha lido resenhas em blogs de leitores daqui, bem provável. E posso dizer como jogador que a expectativa conta muito na hora de avaliar um jogo. Em um caso recente, temos outro redator do GameBlast, Luis Antônio, que estava enfrentando um duro dilema ao avaliar BioShock Infinte com "estaria eu dando essa nota por mérito ou pela empolgação de ter finalizado há pouco?" - e acreditem, vocês também enfrentam esse dilema como jogadores ao falar daquele jogo para seu amigo. Quem nunca jogou um jogo recomendado por um amigo e não gostou muito, achou bem simples se comparado a maneira como o amigo havia apresentado? Posso ser apedrejado por isso, mas eu já não achava The Avengers um bom filme na época do lançamento: eu estava completamente fora do hype. Eu não havia assistido Iron Man, Capitão América ou Hulk. Apenas Thor, uns dois dias antes de assistir o filme em questão e disse à alguns amigos que "o sucesso de The Avengers é apenas por causa da expectativa de quem já havia assistido todos os outros filmes anteriormente e gosta dos quadrinhos; o restante da multidão vai na onda". Vocês podem ficar bravos, mas tem lógica, não? Da mesma forma que fiquei preocupado sobre dar uma nota muita alta para Mystery Dungeon: Gates to Infinity por gostar de Pokémon.


Por causa da expectativa, muitos acabam por dar notas elevadas à jogos mesmo antes de concluí-los. Será que é justo avaliar uma obra completa sem ter degustado por completo? E se pouco depois da parte que o jogador/redator parou de jogar, o jogo dá um salto de dificuldade incrível e isso pesaria em sua avaliação? E se a qualidade da gráfica cai drasticamente depois daquela parte mostrando a falta de comprometimento do estúdio? Outro ponto é o multiplayer, um elemento que todos esperam em jogos hoje. E muitas vezes os estúdios colocam um modo multiplayer fraco (Tomb Raider?) apenas para falar que o jogo tem esse fator para prolongar a vida do produto, mas alguns jogos já nos mostraram que podem viver sem esse modo hoje como Assassin's Creed (seu charme está na campanha), Batman: Arkham Series e arrisco dizer que até Resident Evil, que nunca vendeu por causa do modo The Mercenaries. De certo, hoje é incomum um jogo sem o modo multiplayer, mas não é justo categorizar um jogo como "pior" pela ausência desse elemento.

Na esfera do "contexto", ainda temos a discussão de hardcore e casual. Depois do Wii e de jogos em redes sociais, é evidente que o público de jogadores aumentou e para agradar esse público novos jogos foram lançados com uma estrutura mais simples e nossas amadas franquias foram adaptadas para abraçar também nossos novos amigos. Há quem clame por jogos com a dificuldade de antigamente, mas vale lembrar que a dificuldade não era natural e sim uma deficiência em recursos. "Não salvar" não era para ser mais difícil, mas ausência de tecnologia para fazer isso. Tanto que quando foi possível, até um cartão especial para armazenar conteúdo do progresso em jogos foi lançado para diversos consoles. Logo, se o jogo não é difícil para você e pra mim, parabéns para nós que nos acostumamos com a dificuldade dos 8-bits e hoje dançamos na cara do novo Devil May Cry.

Os bosses da vida real


Como nem tudo é fantasia, as pessoas precisam de dinheiro para viver. E esse dinheiro vem por meio do entretenimento também. Se você trabalha com isso, você precisa estar dentro de algumas regras relacionadas à divulgação, marketing, publicidade e patrocínio. Por meio do apoio de distribuidoras e empresas da área é como muitos sites recebem jogos, em alguns casos, antes do lançamento comercial e para ter esse privilégio é necessário seguir algumas regras.

Felizmente, no Brasil, essas regras são bem abertas ou quase nulas. As distribuidoras são muito amigáveis e gentileza é a essência de muitas delas por aqui. O que não é o caso dos Estados Unidos, se lembrarmos o caso de Jeff Gerstmann que teve de sair da GameSpot por ter dado uma nota ao jogo que, digamos, não agradou muito bem aqueles que estavam acima dele. E casos assim são bem frequentes, apesar de não serem muito divulgados, resultado na perda de alguns privilégios.

Você, para o mundo


E então, você decide criar um blog para falar sobre jogos ou um vlog no YouTube com análises. Isso não é nada inovador hoje em dia, pois é o que mais tem por aí. Há quem diga que é algo ruim, que desvaloriza os melhores, mas é um evento intelectual que, particularmente, admiro muito. É gratificante poder ler/assistir tantas opiniões diferentes. Entretanto, há uma diferença entre falar de um jogo para um leitor e para o seu amigo da escola. Antes de tudo, você precisa "obter" essa opinião, esse ponto de vista. Você não pode esquecer que aquela é a sua opinião, e a sua opinião (sendo parcial ou não) é baseada em sua experiência e gostos. Um jogador que valoriza tanto a qualidade gráfica de jogos, pode não gostar de Minecraft. Um jogador que viveu a era dos 16-bits pode apreciar um remake de Castle of Illusion mesmo que venha sem uma qualidade visual muito próxima dos padrões atuais.

Então, temos a parte de transmitir aquele conteúdo e isso deve ser feito com uma postura respeitosa, ética e bom senso. É necessário ser cauteloso para argumentar bem esse ponto de vista e aceitar feedback sabendo que sua opinião não é a verdade suprema (por mais que possamos pensar isso algumas vezes). E fiquem tranquilos sobre imparcialidade, pois aposto que ninguém gostaria de ler uma análise "cinza", sem sentimento algum, sem experiência alguma do autor, mesmo que essa paixão deva ser apresentada com sensatez.

No que diz respeito ao bom senso, há pessoas que fazem tudo para ter mais views no YouTube ou acessos em seu blog e fazem isso não apenas por análises negativas, mas também por três tipos de conteúdo bem comuns: rumor, teoria e plágio. Ah, essas são as grandes cartas do jogo. O rumor sempre atiça a curiosidade, principalmente se for sobre uma empresa grande ou uma franquia renomada. A teoria, de forma semelhante chama a atenção, mas ainda gera uma repercussão agradável ao autor que quer atenção. Por fim temos o plágio, que pode não parecer ter ligação com os outros dois, mas é feito para ter algum conteúdo sem ter a capacidade de gerar seu próprio conteúdo. E falta de capacidade é o que leva as pessoas, muitas vezes, a recorrerem a esses três.

Uma análise deve agregar valor ao leitor, já que nossa opinião casual nós podemos dar para o amiguinho na escola. Argumentar a razão daquele jogo ter aquele valor é a base de uma análise. Outro ponto importante é estar contextualizado no jogo, já ter lido notícias sobre ele antes do lançamento e se possível até ter jogado suas versões anteriores para entender bem a história. Mas o principal é amar jogos e degustá-los. Você não pode avaliar um sorvete com intolerância à lactose. Poder até pode, apenas não deve!

Revisão: Gabriel Toschi
Capa: Douglas Fernandes

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