Do outro lado da tela
A trama de American Nightmare ocorre após a conclusão da história de Alan Wake, começando com o protagonista preso em uma realidade sombria e perigosa. A sua sobrevivência nesse local lhe garantiu uma superação de seu medo do escuro e transformou o hesitante escritor de thrillers em um destemido caçador noturno, sempre munido de sua arma e lanterna. Agora é a hora dele começar a correr atrás do dano causado pela sua última aventura.Mr. Scratch está com um mal pressentimento sobre esse jogo. |
Para isso, Alan colocou a si mesmo e Scratch em uma espécie de loop de cenas onde os dois passam por uma sequência de atos que acabam voltando ao princípio após sua conclusão. O problema é que o vilão conseguiu lidar muito bem com isso, colocando o seu nêmese preso na própria armadilha, então o objetivo do jogador é encontrar uma maneira de achar uma brecha no loop para impedir, de uma vez por todas, que Mr. Scratch continue espalhando o caos.
O título traz diversos elementos remanescentes do jogo anterior, como os Takens (inimigos que nada mais são que pessoas controladas por uma entidade da escuridão) e o combate através de armas de fogo e do uso da luz. Contudo, algo é fatalmente diferente de Alan Wake: quando se supera seus medos, o terror se torna apenas mais ação, e com os jogos isso não é diferente.
Mão na lanterna, dedo no gatilho
Quando você tem medo de algo, como aranhas ou becos escuros, você evita esse tipo de lugar. A mera presença disso no seu dia a dia pode comprometer seu desempenho, sua hesitação fica crescente, seu foco fica debilitado e seus instintos entram num sistema de constante defesa para com o território à sua volta. Contudo, conforme você se habitua com isso e seu medo vai cedendo, você para de se preocupar, fica pronto para esse tipo de situação e já não se incomoda mais se tiver de passar por aquele beco para chegar mais cedo, ou de ter de pisar na aranha se ela demonstrar ameaça. Com esses jogos, é a mesma coisa.De alguma forma, Alan se tornou um ímã de mulheres nesse jogo. |
Isso é refletido na jogabilidade. Assim como no primeiro título, o jogo gira em torno de dois elementos principais para a sua defesa: a lanterna e a arma. Como em todo jogo de tiro, seja em primeira ou terceira pessoa, o jogador deve usar seu revólver, metralhadora, espingarda ou rifle para se proteger de seus oponentes. Contudo, em Alan Wake, apenas atirar não é o suficiente. Seus inimigos estão cobertos pela escuridão e isso os torna invulneráveis aos disparos. Com isso, é preciso que a luz expurgue as trevas, e é aí que entra a lanterna; uma rajada de luz concentrada pode ser o que separa entre a sua vida e morte – ou a do seu alvo.
Esses elementos deixavam um clima de tensão no jogo anterior, onde o jogador deveria medir com muito cuidado sua munição e baterias, e ficar pronto para inimigos que podiam surgir de onde menos se espera. Porém, American Nightmare não possui essa tensão. Munição aparece com frequência, pois Alan está precavido. Os inimigos não tentam lhe surpreender, pois sabem que não vão conseguir. Forjado nas trevas e no medo, o escritor não mais teme seus inimigos, e o mesmo pode ser dito do jogador que evoluiu com o primeiro título da série. Agora é só iluminar e atirar.
Um tempo de trevas
Contudo, não pense que isso torna o jogo menos impactante, muito pelo contrário. O que lhe falta em sustos, sobra em ação. A dificuldade crescente se adequa à evolução do jogador e à jogabilidade focada no looping temporal dá um grande foco na exploração. Os cenários são grandes e vastos e a cada vez que você volta, descobre algo de novo. A repetição de cenas as vezes incomoda, mas cada nova visita faz o território mostrar uma nova face.Espero que não tenha aracnofobia. |
Outro dos novos oponentes é chamado Splitter, e ele o fará pensar duas vezes antes de focar sua lanterna. Ele pode ser derrubado apenas com tiros, mas se a luz o atingir, ele se dividirá em dois, mais frágeis e fracos, mas muito mais ágeis. Ah, eu mencionei que ele pode se dividir várias vezes? É, cuidado com a luz. Mais uma surpresa fica nos inimigos que atendem pela alcunha de Birdman, que são muito mais fortes, rápidos e resilientes do que os Taken comuns, mas sua principal habilidade é de se transformar em um grupo de pássaros ou aranhas para atacar de maneira diferente ou para se locomover mais rápido.
Isso tudo deixa evidente que a série não estagnou apenas por ter deixado o terror de lado, porque agora a tensão fica em “como vou agir contra esse inimigo?” e não “quando e como um inimigo vai aparecer?”, dando um ar renovado e de superação para o personagem e jogador. Mas nem tudo são rosas nas terras perigosas de Night Springs.
Os Splitters dão trabalho no começo, mas com prática se pega o jeito de matá-los. |
O lado sombrio do progresso
Diferente do primeiro jogo, American Nightmare parece ter perdido um pouco do foco na história. Enquanto o modo cinemático que a narrativa de Alan Wake deixava o jogador entretido e focado, o que abaixava sua guarda para quando um susto surgia, American Nightmare dedicou todo o seu tempo para a ação. Isso cobrou um preço alto.Ao menos o jogo tem cenas memoráveis. |
Ironicamente, o principal inimigo de American Nightmare é o sucesso do primeiro jogo, Alan Wake. Isso fica poético se levar em conta que o maior inimigo de Alan é o personagem que foi criado no primeiro título, mas só ganhou notoriedade na sequência. A vida imita a arte.
Não tenha medo do escuro
"Jogue meu jogo ou ela morre! Haha!" |
Contudo, isso não o torna um jogo ruim. Se você ver ele da perspectiva de progresso do protagonista, como alguém superando seus medos e aprendendo a enfrentar a escuridão, terá aqui um grande jogo para passar o tempo e se divertir. Isso só levanta dúvidas sobre o futuro da série se continuar seguindo este padrão de ação. Torçamos para que a Remedy Games, após a conclusão de Quantum Break, deseje retornar para as raízes da franquia. Caso contrário, talvez o futuro de Alan Wake seja meio obscuro.
Prós
- Jogabilidade instintiva e divertida;
- Cenários cheios de cantos para explorar;
- Retorno dos colecionáveis como as páginas de manuscrito, que expandem a profundidade da história;
- Ação ininterrupta e de dificuldade progressiva.
Contras
- Não possui muitos elementos de terror como seu predecessor;
- Trilha sonora não muito vasta;
- Se torna repetitivo com o tempo.
Alan Wake’s American Nightmare – PC – Nota: 7.5
Revisão: José Carlos Alves
Capa: Stefano Genachi