Quando foi lançado apenas como um mod de Half-Life 2, em 27 de julho de 2011,
The Stanley Parable já propunha uma experiência interativa muito diferente do comum. Sem combate ou sequências orientadas à ação, o jogo já colocava o jogador na pele de Stanley enquanto evocava questões sobre o poder da escolha (e a realidade da falta dele) nos videogames da atualidade e o impacto disso na narrativa interativa. Em 17 de outubro de 2013, Davey Wreden, o criador do mod original, lançou uma versão reformulada, com uma experiência mais robusta e em formato
stand-alone — isto é, sem ser um mod de uma outra engine.
Um funcionário exemplar
O enredo, quase sempre instável, começa ilustrando Stanley, um funcionário alegre de uma grande corporação que há anos trabalha pressionando botões. Seguindo as ordens de seu monitor, Stanley, o funcionário número 427, pressiona botões o dia inteiro e acredita ter nascido para seu cargo.
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Stanley nunca parou para questionar sua obediência cega às ordens, fazendo uma analogia à comodidade narrativa dos próprios jogadores |
Um dia, Stanley ficou por mais de uma hora em seu escritório esperando que alguma ordem viesse de seu monitor, algo que nunca havia acontecido até então. É quando Stanley percebe que nenhum de seus colegas de trabalho, funcionários ou chefes apareceram para lhe dar ordens, convocar uma reunião ou simplesmente dar um oi. Instigado a descobrir o motivo disso, e motivado por uma estranha voz em sua cabeça que narra tudo o que está acontecendo, Stanley e, por extensão, o próprio jogador são levados a sair do cubículo 427 a fim de investigar o problema…
...Ou não.
A maior proeza de The Stanley Parable está exatamente em ele ser um não-jogo, no fato de ele contrariar as expectativas que qualquer jogador poderia ter dele. Isto é, ao passo em que o jogador está muito mais acostumado a seguir uma narrativa que tem o desenrolar da história como consequência direta de suas ações, The Stanley Parable propõe que enxerguemos essa técnica de narrativa interativa com outros olhos e que desafiemos seus fundamentos e verdades assumidas.
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Muito além de apenas piadas, a quebra da quarta parede é o principal artifício usado para desafiar os conceitos preconcebidos do jogador |
O primeiro grande momento em que o jogo oferece uma dica sobre a necessidade de se abandonar esse conceito batido de narrativa nos jogos é em uma bifurcação no caminho. O narrador, que acompanha Stanley desde o primeiro momento e que, com isso, influencia o jogador indiretamente em suas decisões, narra a história como se Stanley tivesse que passar (ou como se já tivesse passado, dependendo do número da tentativa) por uma das portas, mas a verdade é que ambas levam o jogador para um nível mais ou menos imersivo de opções que exploram o quão limitado nossa capacidade de atuação realmente é.
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A decisão das portas é importante por ser a primeira vez que fica claro que o jogador tem toda a liberdade de se opor à narrativa |
A decisão é sua
O que The Stanley Parable busca fazer é nos dar alguma compreensão a respeito do nosso papel como construtores de narrativas interativas enquanto jogadores de videogame. Para apoiar essa noção, o jogo carrega consigo mais de 20 finais diferentes, que variam de simplesmente seguir a narrativa sugerida pelo narrador sem nenhum questionamento até encontrar defeitos (propositalmente criados) dentro do jogo. Além disso, outros finais são metanarrativos, no sentido em que o próprio ato de jogar se torna uma história por si só, nos mostrando que o jogo não se trata da história de um homem chamado Stanley, e sim simplesmente do jogador e da sua capacidade de decisão diante de uma experiência interativa.
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Um dos possíveis caminhos de enredo envolve o reinício do próprio jogo como parte da narrativa conduzida pelo enérgico narrador |
Assim como jogos como Dear Esther e Thirty Flights of Loving, The Stanley Parable busca ser uma experiência narrativa para fazer com que o jogador em si pense no significado de suas ações depois que joga, ao invés de agregá-las automaticamente ao mundo do jogo como a maioria dos jogos modernos espera que você faça. Nesse aspecto, The Stanley Parable deixa de ser apenas um jogo para se tornar uma das melhores e mais esclarecedoras experiências que nos permitem reavaliar nosso próprio papel como simples jogadores de videogame.
Prós
- Uma experiência narrativa até então inexplorada e nunca vista;
- Senso de decisão e linearidade narrativa são confrontados constantemente;
- Divertido e animado graças à narração de Kevan Brighting.
Contras
- Pouco ambicioso em sua totalidade;
- A experiência depende da tentativa e do erro para que surjam novos caminhos;
- Alguns finais são propositalmente muito difíceis de se encontrar ou de se efetuar.
The Stanley Parable - PC - Nota: 7.5
Revisão: Samuel Coelho
Capa: Sybellyus Paiva